“O Irão é um vulcão que pode explodir a qualquer momento”

Para Shirin Ebadi, “uma mudança efectiva no Irão terá sempre origem na sociedade”.

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Shirin Ebadi, prémio Nobel da Paz, foi a Estrasburgo receber o prémio Sakharov em nome de Nasrin Sotoudeh PATRICK HERTZOG/AFP

Em entrevista ao PÚBLICO, Shirin Ebadi fala de um Irão prestes a “explodir violentamente” numa revolta que poderá levar a “uma mudança efectiva [que] terá sempre origem na sociedade”.

No discurso de aceitação do prémio Sakharov por Nasrin Sotoudeh, lido por si hoje no Parlamento Europeu, lia-se uma mensagem de alguma esperança na possibilidade de haver uma mudança no Irão em breve. Nasrin Sotoudeh usou o exemplo da África do Sul de Nelson Mandela e da Birmânia de Aung San Suu Kyi. Acha que esta esperança é realista?

O Irão é como um vulcão que pode explodir violentamente a qualquer momento e sem aviso. Por isso, não dá para marcar uma data ou definir um prazo quando falamos de questões que dependem da sociedade. Mas dá para fazer previsões, e, para isso, basta seguir a actualidade. E eu, muito sinceramente, penso que vai acontecer algo, vai haver uma mudança significativa, num futuro próximo.

Na África do Sul e na Birmânia, apesar da influência que a revolta popular e a pressão internacional tiveram, a derradeira alavanca para uma mudança efectiva foi política. Acredita que será este o caso no Irão, ou a explosão de que fala será das massas, como na Primavera Árabe?

Na Primavera Árabe, os islamistas tornaram-se muito poderosos, conseguiram, nalguns casos, tomar as rédeas de todo o processo, e isso é algo que representa um verdadeiro desafio na região do Médio Oriente. Mas os iranianos sabem o que é um Governo religioso, eles sabem o que é viver num país com perseguição com base na religião. Eles sabem qual é o preço a pagar e, por isso, são muçulmanos ao mesmo tempo que são seculares. Posto isto, e salvaguardada esta diferença do Irão em relação aos países em que a Primavera Árabe teve efeito, uma mudança efectiva no Irão terá sempre origem na sociedade.

Acha que a atribuição do prémio Sakharov a dois iranianos, tal como quando a galardoaram em 2003 com o prémio Nobel da Paz, produz algum efeito no iraniano comum?

O povo iraniano está muito ciente deste prémio, e, graças à língua persa, que é uma das mais usadas na Internet, este acontecimento é assimilado e celebrado por muitos iranianos. Estes prémios têm um grande efeito no iraniano comum, porque é aqui que ele se apercebe de que o mundo não se esqueceu dele. É uma maneira de ele ficar a saber que o mundo olha para o seu país e que há muita gente a acompanhar a nossa situação. Com estes prémios, o iraniano comum fica a saber que há gente de todo mundo que está grata pela sua luta pela liberdade.

E acha que a comunidade intelectual do Irão, à qual pertencem Nasrin Sotoudeh e Jafar Panahi, está próxima do iraniano comum?

Repare que, apesar de terem sido eles os dois a ganharem o prémio Sakharov, e apesar de serem, de facto, parte de uma elite intelectual, a verdade é que a maior parte dos presos políticos no Irão não são intelectuais, não pertence necessariamente às letras, às artes e à ciência. Muitos deles são trabalhadores. Há 20 professores presos no Irão. E os estudantes são mais de 100.

O vencedor do Nobel da Literatura de 2012, o chinês Mo Yan, foi amplamente criticado por não ter feito referências políticas no seu discurso de aceitação do prémio. Como é que o compara a Jafar Panahi, que está em prisão domiciliária pelos seus filmes?

Não é necessário que todas as pessoas pensem o mesmo, e, apesar de várias liberdades serem inexistentes, a verdade é que todos temos direito a adoptarmos o estilo que quisermos perante os problemas dos nossos países. É uma escolha de Mo Yan. Não vou ser a impor-lhe a minha vontade.

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