“True Detective” é uma série americana que tem causado furor nos EUA. Integralmente escrita pelo romancista Nic Pizolatto e realizada por Cary Joji Fukunaga, as interpretações principais cabem a Woody Harrelson e Matthew McConaughey nos papéis dos detetives Marty Hart e Rusty Cohle.
A série é uma clara homenagem às revistas “pulp” de inícios do século XX — revistas baratas, de papel mau e capas sensacionalistas, vendidas aos soldados americanos que partiam para as Guerras, repletas de histórias sangrentas de policiais negros, de horror, de aventuras em lugares exóticos, fantásticos ou futuristas, cujas capas mostravam mulheres indefesas em perigo a ser heroicamente salvas por homens solitários e taciturnos.
“True Detective” era justamente o nome de uma dessas revistas, dedicada a crimes talvez reais, mas a série inspira-se também noutros elementos dessas histórias, como a Carcosa e o Yellow King, dos contos de Robert W. Chambers, os cultos misteriosos e comunidades incestuosas das histórias de Howards Phillip Lovecraft, e a filosofia niilista das personagens de Thomas Ligotti.
A influência “pulp” borbulha nas próprias personagens — “Marty” Hart, o polícia violento e mulherengo, e “Rusty” Cohle o cavaleiro solitário que sussurra monólogos sobre o vazio da existência no mundo. Personagens que partem em jornadas solitárias e quixotescas para salvar mulheres indefesas que têm o papel de mães, filhas ou prostitutas, ou que — no auge do caos — podem ser tudo isso ao mesmo tempo.
Por esse retrato, a série foi acusada de machista ou misógina, por críticos que talvez tenham esquecido que o pulp, e especialmente o “pulp noir”, é o género trágico da masculinidade incapaz de lidar com o terror da emancipação feminina. Mas é significativo que uma série de inspirações e valores aparentemente tão arcaicos tenha captado o imaginário popular, ao ponto de ser a série mais vista da HBO dos últimos dez anos, ultrapassando outras séries como The Game of Thrones.
E é também significativo que há dez anos o imaginário popular, entre tempos de prosperidade, se tivesse deixado fascinar por um macho chamado Tony Soprano que resolvia os seus problemas junto de uma mulher psicanalista e que hoje, entre tormentos de crise económica, esse imaginário precise de um Rusty Cohle que não parece querer outra coisa da vida senão salvar mulheres confusas e indefesas.