O medo também tem medo?
O Partido Socialista deu-se à morte na segunda volta para votar no Partido Republicano. Isto é uma situação deveras preocupante para defensoras ?da democracia como Marine e Marion Maréchal le Pen.
Afinal, podemos vir a ser o Passos Coelho e o Paulo Portas de França? A esquerda é mesmo capaz de tudo contra nós? Tanto ódio porquê?!... Tia Marine, estou cheia de medo.
— Calme-toi, Marion, temos tempo.
Marine e Marion, filha e neta de Jean-Marie, tia e sobrinha na Frente Nacional. Unidas pelo mesmo sangue velho gaulês e, vejam só, juntas contra o “medo”. O Partido Socialista de François Hollande apelou aos seus candidatos e eleitores para hoje votarem nos Republicanos de Sarkozy em todas as regiões em que a Frente Nacional (FN) ganhou a primeira volta das eleições. Para duas xenófobas com mestrado e doutoramento em nacionalismo, é isso que é apelar ao medo e um “golpe contra a democracia”.
— Calme-toi, Marion, cedo ou tarde, on va gagner. Em 2017, serei Presidente de França.
— Mas aí já vou a caminho dos 28 anos, tia, a França precisa de nós agora, contra o medo!
— Ai, a beleza da juventude... As minhas grandes promessas eleitorais são para cumprir: a região de Calais vai deixar de oferecer mosquiteiros antipaludismo aos prisioneiros do Senegal.
— Por isso é que tem havido este descalabro das contas públicas! Redes mosquiteiras!
— Mais do que isso, e em coerência com os princípios da Frente Nacional, vamos deixar de ensinar às nossas crianças (as francesas... as que poderão ir à escola) aonde raio fica esse Senegal. Depois, organizamos uma grande expedição à África desconhecida para descobrir a foz do mítico rio Senegal, que os nossos exploradores subirão heroicamente. Fundaremos uma grande capital a que chamaremos, sei lá, Dacar, com a sua feitoria e a sua casa dos escravos.
— Bravo, tia. Mas, desculpe o meu medo... África não está ainda um pouco cheia, hum, de estrangeiros?
— Teremos de pacificar o Senegal recém-descoberto, esmagando eventuais rebeldias indígenas, mas para isso o meu pai e teu avô poderá emprestar-nos a sua experiência na guerra da Argélia. De qualquer modo, sem mosquiteiros, a vitória é nossa, porque a malária trata com égalité do assunto dos indígenas, a bem do progresso e da civilização. Vive la France!
— Viva!... Tia Marine, o vovô Jean-Marie e a tia ainda estão zangados um com outro?
— Minha querida, metade da nossa zanga pública foi fita política combinada. Para eu aparecer como moderada. O resmungão Jean-Marie a fazer o papel do nazi mau e eu o do naz... oh la la, pardon, eu queria dizer o polícia mau e o polícia bom... Mas tenho grande planos para o teu avôzinho. Vestimo-lo de Napoleão e mandamo-lo invadir a Rússia.
— Para longe desta França onde os socialistas querem impor o medo! O Putin, comparado com esse antidemocrata do Hollande, é um exemplo para o mundo. Pelo caminho, tia, o vovô Jean-Marie até pode pôr finalmente uma coroa de flores em Auschwitz.
— Martine, querida... O meu pai sempre disse que esses pormenores do Holocausto e das câmaras de gás, e não sei quê, foram exagerados, foi tudo “um detalhe histórico”... Pôr flores nos fornos crematórios, é?
— Ma chère tante, o vovô quer depor as flores no cadafalso onde os socialistas enforcaram o comandante do campo, o Rudolf Hoess. Um homem que se limitou a cumprir o seu dever pela pátria... Até dá medo pensar no que ele sofreu ali mesmo ao lado da casa onde criou os filhinhos com amor. Eu sou pela família.
— Bem diz o teu avô que tens bom sangue, Marion, até eu estou gelada... quer dizer, impressionada.
— E o problema dos terroristas-refugiados... não é que eu os confunda, é só para simplificar a questão.
— Vamos libertar a França desta submersão migratória, bien sûr. Em Calais, os que vivem na “selva” dos acampamentos serão convidados pela tropa a escolher entre duas boas saídas para Inglaterra: ou por mar da Mancha, mas sem barco, ou pela via férrea do túnel, mas com cabos de alta tensão...
— Só a tia me fazia rir nestes tempos de pânico socialista. Nós, as mulheres, temos medo. As mulheres francesas têm duas boas opções com a Frente Nacional: ou ficam em casa a tratar dos filhos ou vão para a política “tratar” dos estrangeiros.
— E temos de trazer a Paris o Donald Trump, um grande republicano sem papas na língua. Também em 1778 le Roi-Soleil Luís XVI assinou em Versalhes um tratado com Benjamin Franklin.
— Mas o Donald Trump não vem falar de liberdade, imagino. Vem explicar como nos vermos livres dos muçulmanos, não é, tia Marine?
— Sim, Marion, mas antes disso vai ter de me dar o telefone do seu cabeleireiro. Nós somos loiras, mas ele!... Aquilo é que é uma franja à la Frente Nacional.