Caminhar pelo passeio marítimo de Beirute e dar de caras com 31 vestidos de noiva pendurados a balançar ao sabor do vento? Aconteceu no fim-de-semana passado. Trata-se de uma instalação criada no âmbito de uma campanha para pôr fim à “lei da violação” libanesa, que permite que um violador escape a uma condenação se se casar com a vítima, conta uma notícia da Al Jazeera. A iniciativa, promovida por um grupo de activistas, é apoiada pela artista franco-libanesa Mireille Honein, responsável pelo desenho dos vestidos.
A lei contestada é o artigo 522 do Código Penal do país. Este decreto suspende automaticamente a execução de uma sentença caso o violador se case com a vítima. A lei estende-se ainda a casos de raptos ou de violação de menores. No ano passado, foi feita uma proposta de alteração da legislação, que será votada apenas a 15 de Maio. Para já, os activistas lutam para que a abolição seja antecipada.
Os vestidos, feitos de papel e renda, estão pendurados entre as palmeiras da capital e fazem lembrar corpos de mulheres mortos. “Pendurei-os porque este tipo de lei retira às mulheres a sua essência, deixa-as sem identidade, deixa-as circunscritas a uma vida onde não se encaixam. [A lei] é uma vergonha para aqueles que a impõem”, disse a artista responsável pela obra à Al Jazeera.Cada vestido representa um dia do mês. “Existem 31 dias no mês e a cada um desses dias uma mulher pode ser violada e forçada a casar-se com o violador”, explica à AFP Alia Awada da Abaad, uma organização não-governamental libanesa.
A exposição simbólica visa pressionar o primeiro-ministro Saad Hariri a abolir esta controversa lei. Foi ainda criada uma petição que apela ao parlamento para dar prioridade a este assunto.
O que é o artigo 522?
No Líbano, a violação é um crime punido até sete anos de prisão. A pena por violar um menor ou alguém com incapacidade física ou mental é mais longa — no entanto, a lei actual permite que o violador case com a vítima e escape à punição. Os representantes políticos libaneses têm-se mostrado bastante mais abertos a abolir esta lei. Em Fevereiro, uma comissão parlamentar votou para pôr fim ao artigo 522 e os activistas mantêm a esperança que a lei seja abolida na nova votação a 15 de Maio.
Não é a primeira vez que esta legislação é alvo de censura pública. Já em Dezembro de 2016 a organização Abaad tinha encenado um protesto contra a mesma lei, onde várias mulheres utilizaram vestidos e pensos ensanguentados.