O espectro partidário português tem-se mantido quase inalterado ao longo dos anos. E se isso, por um lado, pode considerar-se um bom sinal, porque significa que ao contrário de outros países europeus o eleitorado português não adere facilmente a discursos populistas, também pode significar um alheamento cada vez maior e mais difícil de recuperar entre os cidadãos e a política. Fenómeno recente e que justifica o “quase” da primeira frase é o PAN, Partido Pessoas-Animais-Natureza. Com os resultados conseguidos nas eleições europeias, o PAN dá a ideia de ser mais do que um epifenómeno e, de repente, até surge como eventual solução para viabilizar ou mesmo fazer parte de um governo liderado pelo PS.
Tem-se associado o meritório resultado do PAN a uma espécie de vaga ambientalista que varreu toda a Europa e tornou os partidos ecologistas os grandes vencedores do acto eleitoral. Admito que, dos partidos com representação parlamentar, o PAN tenha sido, juntamente com o Bloco de Esquerda, a escolha mais óbvia para quem vê nas questões ambientais não um assunto, mas o assunto. Mas isso não significa que o PAN seja, de facto, um partido ecologista. Antes é, de forma destacada, um partido animalista. A partir daqui podíamos dizer que fazem falta os partidos que trazem novos assuntos ou novas abordagens aos mesmos assuntos e, empolgados com esta afirmação, até dizer que é também disso que se faz a democracia. Só que esse tipo de discurso enrolado e anódino tem como resultado, na grande maioria das vezes, acabar com a discussão antes mesmo de ela começar. E não é assim que a democracia se constrói.
Qual é, então, a grande bandeira do PAN? A defesa dos animais. Mas isso, enquanto programa político, é rigorosamente zero. É rigorosamente zero, mas nem por isso pouco eficaz, porque politiza algo afectivo e íntimo, como é a relação entre o dono e o seu animal de estimação, porque transporta para o campo político algo que não é mais do que moral e ético.
Pior do que esse aproveitamento que faz do nosso carinho pelos animais, parece que este tipo de agenda animalista tem uma subtileza que passa pela progressiva igualação entre pessoas e animais. Ora, isto é um disparate. E todos os passos dados nessa aproximação, como as alterações jurídicas ao estatuto do animal que são uma nulidade em termos práticos, ou a insuportável cruzada anti-touradas, mostram como é um disparate.
Pegando neste último aspecto, há um radicalismo por parte dos defensores dos animais que é inconcebível. Num comportamento digno de regime totalitário, pretendem impor a sua visão, que é legítima, em relação ao sofrimento do touro, sem para tal se preocuparem com a adesão que a maioria da população tem a esse argumentário. Querem, no fundo, privar as pessoas de um espectáculo, apenas porque não concordam com o conteúdo desse espectáculo. Onde é que já ouvimos isto? Toda esta discussão à volta dos animais começa inquinada, o que demonstra bem o radicalismo que a caracteriza. Dizer, por exemplo, que os animais são um instrumento ao serviço do ser humano parece uma heresia; e, como heresia que parece ser, segue-se-lhe a condenação no fogo inquisitório das redes sociais.
Tudo isto para dizer que o PAN não é principalmente um partido ecologista, sendo antes um partido animalista. Se souber, como parece estar já a tentar fazer, mudar o seu discurso e transformar-se num partido verdadeiramente ambientalista, poderá ser olhado com outra seriedade e consolidar-se cada vez mais, mas pelas razões certas.