José Eduardo Martins: “Não é impossível que a legislatura dure quatro anos”

José Eduardo Martins Ex-dirigente do PSD acusa Rio de se perder em “discussões estéreis” e prevê que a esquerda faça a vontade a António Costa para impedir a direita de chegar ao poder.

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José Eduardo Martins, ex-secretário de Estado do Ambiente de Durão Barroso e Santana Lopes, não ficaria surpreendido se a legislatura fosse até ao fim dada “a predisposição da esquerda para aceitar tudo o que o PS faça desde que a direita não volte ao Governo”. Em entrevista conjunta que pode ouvir na Renascença esta quinta-feira a partir das 13h, acusa Rui Rio de se perder em “discussões estéreis” e refuta a crítica de que o candidato que apoia para a liderança do PSD, Miguel Pinto Luz, é um desconhecido. “Por essa ordem de razões, candidatávamos o eng. Ângelo Correia, porque é muito conhecido”. 

Se fosse líder do PSD, o que é que já teria dito a António Costa depois de ver o Governo que constituiu e o programa de Governo que apresentou?
A primeira coisa que teria dito a António Costa, dois dias depois das fantásticas conversas com a antiga maioria parlamentar, era dar-lhe os parabéns por ter tomado a iniciativa de retomar o costume constitucional que interrompeu há quatro anos quando precisou. Quando António Costa precisou, houve geringonça. Toda a gente à esquerda do PS estava à espera de ver ali uma espécie de Jeremy Corbyn. Assim que António Costa ganhou, toda a ladainha de há quatro anos foi fora como o bebé com a água do banho. Já não é preciso “geringonça” nenhuma, acordo escrito nenhum. Como agora só precisa de engambelar um de cada vez, tanto faz o PCP ou o BE. Como a direita teve a sua maior derrota, significa que, com umas presidenciais no meio e tendo garantido por definição que não vai ter problemas para aprovar este programa de Governo espantoso que tenho à minha frente e o OE, António Costa pode ter duas perspectivas na cabeça: levar [até ao fim] o Governo minoritário - se passar os dois primeiros anos neste jogo em que ninguém quer ser responsável pela instabilidade, consegue aguentar mais dois; ou então, daqui a dois, forçar eleições.

Acha possível então que o Governo dure quatro anos?
É provável que dure dois, mas não acho impossível que a legislatura dure quatro anos. As eleições presidenciais daqui a ano e meio serão um óptimo motivo para nos distrairmos de tudo o resto. Com excepção do PCP, parece haver uma predisposição à esquerda para aceitar tudo o que o PS faça desde que a direita não volte ao Governo. É uma coisa pobrezinha e poucochinha.

O que é certo é que a direita não pôde fazer nestas eleições o que o PS fez em 2014 ficando em segundo lugar porque não teve votos suficientes para isso, PSD e CDS.
Pois, porque a direita não cresceu com três partidos novos, um dos quais de um anterior presidente do PSD [a Aliança], os outros dois até elegem um deputado. Um [a Iniciativa Liberal] não é bem um partido liberal, é mais um partido libertário. 

Como é que se vê o facto de o Chega ter saído do PSD e não do CDS?
Ambos saíram do PSD, o presidente da IL era um apoiante de Pedro Passos Coelho. Boa parte das pessoas da IL teve a esperança de que com Passos o PSD se transformasse pura e simplesmente num partido liberal. 

Passos foi o líder mais liberal que o PSD já teve.
Mas o que é isso de ser liberal? Tinha algumas frases um bocadinho mais aselhas como aquela do querer ir para além da troika que é uma das razões conjunturais pelas quais o PSD está na situação em que está. Nós temos três partidos novos, dois elegem deputados, o CDS quase desaparece e o PSD tem um resultado miserável e a direita não cresce. Mas há uma coisa insofismável: o PSD tem 28%, não tem 2%, 4% ou 5%. Para organizar um bloco político de centro-direita que faça alternativa ao PS tem que ser liderado por PSD. Para além disso, o PSD tem um congresso à porta, o que calhou que nem mel. Havendo um congresso normal à porta, o PSD tem uma oportunidade para reflectir e mudar se quiser.

E acha que vai querer mudar?
Espero que perceba que tem que mudar. O PSD tem essencialmente um problema conjuntural que é essa fase da passagem da troika em que nós ficamos injustamente associados a uma situação que não criamos que foi o ter que pedir dinheiro. Quem executou as políticas públicas que deixaram o país naquela situação em 2011 não foi o PSD. O PSD com o seu excesso de voluntarismo colou-se ao programa da troika e quando se tentou livrar dele já era tarde. O segundo problema é que metade das pessoas desistiu disto: não vota, não se interessa. Onde é que a direita podia ter crescido? Nas pessoas que ficaram em casa, que não tiveram estímulo, não tiveram orgulho. Tudo o que é novo e radical, mobiliza.

Como diz Miguel Morgado, tem que se pedir desculpa antes de se dizer que se é de direita?
Não tem a ver com uma questão cultural. O programa de Miguel Morgado seria excelente num país que conseguisse atrair muito capital estrangeiro e ter um sector privado, dinâmico e activo. O terceiro problema do PSD é que ainda não passou para o tempo novo do séc. XXI e não tem uma resposta estruturada e substantiva. Parece que estamos a fazer como os outros, que queremos correr atrás da espuma dos dias, responder às notícias e não aos problemas, como foi o caso dos professores de há três meses e o que nos custou!

Qual deve ser a prioridade do PSD?
Em primeiro lugar, é não se pôr em discussões estéreis sobre liberais e sociais-democratas. Quer-me parecer que a resposta do PSD actualizada é coerente e integrada para um país que infelizmente continua pobre e tem que lutar sempre para deixar de ser pobre. O dr. Rui Rio anda a dizer que quer travar o avanço dos liberais. Mas o PSD é um partido que acredita antes de mais no capitalismo do mercado, na iniciativa privada, na empresa, mas acredita sobretudo na pessoa e ao acreditar na pessoa e na liberdade não acredita na pessoa do cada um por si, numa sociedade selvagem em que o Estado é completamente indiferente ao funcionamento do elevador social ou à redistribuição da riqueza. Posições dogmáticas contra a redistribuição da riqueza, acolhimento dos imigrantes, que parece que se diz que são a nova direita não são nova direita coisa nenhuma e se são, não são património do PSD. Não é preciso pedir desculpa para se ser de direita mas é preciso entender sociologicamente um país que não somos nós e os nossos amigos nos restaurantes de Lisboa.

 O futuro da direita passa por um bloco de direita?
Com o CDS e todos os que não rejeitem a democracia liberal. Mas não estou a ver que seja preciso uma coligação pré-eleitoral. 

Três razões para distinguir um novo programa do PSD desse do PS que tem à sua frente.
Eu invertia as prioridades. Foi uma novidade dogmática o facto de a esquerda ter sido governo, carregando nos impostos indirectos e esquecendo a progressividade dos impostos directos. Agora, este programa vem dizer que quer outra vez a progressividade dos impostos directos. Isto significa apenas e só o erro dos franceses: o confisco aos poucos que mais produzem em nome de uma falsa redistribuição para afastar o capital que precisamos. Parece-me uma ideia muito perigosa. As quatro prioridades do Governo são, por esta ordem, combater as alterações climáticas, responder ao desafio demográfico, construir a sociedade digital e reduzir as desigualdades. Reduzir as desigualdades é o primeiro desígnio da direita. A direita sabe que precisa de uma vida no capitalismo e do capitalismo para garantir a liberdade. Sem capitalismo, vai-se primeiro a liberdade e depois vai-se o pão. Mas o capitalismo não está a evoluir quer para controlar a depressão dos recursos nem para combater as desigualdades. As desigualdades são cada vez maiores. Se a direita viver bem com as desigualdades, há-de ter vergonha de dizer que é de direita. Se a direita não tiver vergonha de dizer que está aqui num país com 10 milhões de pessoas em que a esmagadora maioria vive com dificuldades reais, tem obrigação de estar aqui para combater as desigualdades. Temos que propor uma revisão de IRS que combata a desigualdade, mas temos também que dizer que a primeira coisa que combate a desigualdade é não desistir do crescimento e aperfeiçoar a redistribuição. 

Eu, que digo há 20 e tal anos coisas que ninguém levava a sério sobre o Ambiente, acho que é pura e simplesmente ridículo que o programa do Governo tenha como primeira prioridade o combate às alterações climáticas. Em primeiro lugar, a nossa situação de pegada carbónica não é assim muito grave, para o todo global contribuímos muito pouco, e porque esta não é a primeira prioridade deste país pobre. A direita não tem que ter vergonha de estar na primeira linha do combate por um ambiente são. Agora, a troco dos sound bites da Internet, das capas das revistas internacionais, ir atrás da voragem dos dias para tomar decisões precipitadas, tantas, como este Governo tomou no último ano e meio para aprovar todos os disparates que o PAN põe em cima da mesa na AR isso não é fazer política pública de Ambiente nem proteger as próximas gerações.

Que disparates?
Criar um sistema de recolha para PET [embalagens de plástico] a estropiar o que já funcionava no mecanismo de recolha das embalagens primárias, fazer um diploma completamente panfletário sobre as beatas dos cigarros que quis fazer das beatas um lixo diferente de todo o outro lixo quando a legislação é completamente redundante. Não resolvemos problema nenhum. O que o PSD tem que ser é a contracultura do substantivo contra a espuma dos dias. É disso que os moderados razoáveis que estão em casa e que não foram votar estão à espera. 

Porque é que apoia Pinto Luz?
Vou votar Miguel Pinto Luz porque é aquele que percebe que precisamos de agregar todos, não nos perdermos em discussões estéreis mas sobretudo de virar o PSD outra vez para fora para aquele milhão de pessoas que deixou de votar em nós e que precisamos que volte a acreditar em nós. 

Coisas obscuras? “Comemos jaquinzinhos que talvez não tivessem o tamanho adequado"

Quem conhece Pinto de Luz?
Quando foi a primeira vez que ouviu falar da deputada Joacine Katar Moreira? É uma má comparação mas por essa ordem de razões ninguém começava de novo na política. Podíamos candidatar o eng. Ângelo Correia porque é muito conhecido. Não sendo conhecido, Pinto Luz tem um conjunto importante de apoios dentro do PSD. Não o menosprezem. Isto é uma eleição que desta vez é decidida a duas voltas. Precisamos unir o PSD e produzir um programa coerente com a cultura do substantivo. O PSD não pode ter um dia uma posição sobre os professores que é contraditória com a posição que tem sobre a administração pública. 

Na apresentação de recandidatura, Rui Rio disse também que avançava contra interesses obscuros. Que interesses estão por detrás da candidatura de Miguel Pinto Luz que apoia?
No outro dia, comemos uns jaquinzinhos. Não tenho a certeza que tivessem o tamanho mais adequado. Julgo que foi a coisa mais obscura que fizemos até agora. Essa farpa, esse comentário, que não é muito elegante, era para o candidato Luís Montenegro.

Porquê? Pelo que li, os dois são ou já foram maçons.
Não sei. Eu vou fazer 50 anos daqui a dois meses e nunca ninguém me deu um passou-bem esquisito ou me convidou para uma organização onde seja preciso reunir-se sem os outros saberem. 

Acha isso relevante para a política?
Foi uma observação muito deselegante. Se não é sustentada em algo substantivo parece uma declaração acrimoniosa que é das últimas coisas que precisamos nesta altura. Era escusada. Boa parte dessas coisas esconde que os dois candidatos anunciados estão a falar apenas e só para o PSD. Temos que perceber que o nosso problema estrutural é o milhão de votos que nos falta, não é o milhão e meio de votos que temos sempre.

No Montepio, apoiou Tomás Correia. Este perdeu entretanto a sua confiança, acha que sai tarde demais do Montepio?
Não. Fiz parte da sua comissão de honra, o meu dinheiro está no MG, sou um associado da Associação Mutualista que perante as alternativas escolheu uma. Fê-lo pela primeira vez na última eleição quando era difícil. Não estou arrependido. Não confundamos as contraordenações do Banco de Portugal com as do Instituto de Seguros. Eu não sou um dos que vieram da China para dizer “Agora gosto muito do dr. Tomás Correia”. Sobre o Montepio, registo duas coisas: é a única instituição financeira portuguesa e era bom que o BdP às vezes pensasse um bocadinho nisso; cada vez que o governador do BdP é acossado o Montepio entra na berlinda e cada vez que entra na berlinda aquilo que estamos a fazer é esta estratégia do BCE de concentração bancária. A estratégia do BCE de concentração bancária não é boa para Portugal. Não quero que Portugal seja uma colónia de bancos estrangeiros e de uma concentração bancária desejada pelo BCE.

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