Avós paternos para sempre
A bem da redução do sofrimento dos avós e das crianças: eis algo que devia estar na agenda do nosso Parlamento.
Parece pertencer ao domínio do bom senso a ideia de que, após um divórcio, os avós que tinham contacto regular com os netos, assumindo muitas vezes o papel de um dos progenitores, e passando (não raro) mais horas com os netos do que os pais, devem ter direito a manter algum tipo de contacto regular com os netos após um divórcio. Mas infelizmente, e num contexto de aumento de divórcios conflituosos, os avós acabam por ser, quase sempre, a parte mais fraca da equação e apesar de a lei já lhes conferir direitos há bastante tempo, a tradicional (e injusta) tendência para favorecer nos processos litigiosos a posição da mãe acaba por afastar muitas vezes (com graves danos para a criança) os netos dos seus avós paternos. Neste caso, como em tantos outros que maculam a nossa Justiça, a impreparação e insensibilidade de muitos juízes (fruto do processo muito imperfeito de selecção, admissão e avaliação para a função que existe em Portugal) cria mais problemas do que aqueles que eram previstos pelo legislador.
A situação é particularmente grave quando – apesar das protecções que a Lei já confere – os processos judiciais se arrastam (um adjectivo comum na nossa Justiça) durante dois, três, quatro ou mais anos e durante esses anos os laços afectivos são quebrados para além de qualquer recuperação quando se tratam de crianças de muito tenra idade (até aos 5-6 anos) ou quando os avós, um deles, em função da sua idade, acaba(m) por falecer enquanto o processo se arrasta nos tribunais.
O problema decorre do cruzamento nefasto de três factores: o aumento da conflitualidade dos divórcios, o que complica a regulação do poder paternal, a lentidão da Justiça e a tendência desproporcional dos juízes a preferirem a mãe em comparação com o pai. Se o terceiro factor pode vir a diluir parte do problema com a eventual alteração no Código Civil que visa favorecer a residência alternada, um regime que promove melhor o convívio familiar e é recomendado pelo Conselho da Europa, o problema é que isso não será suficiente se persistirem os problemas de lentidão e ineficiência da Justiça e o nível de “guerrilha parental” persistir, com alguns pais a usarem os filhos como armas de arremesso contra o outro progenitor, apanhando de reflexo os avós.
Apesar de os direitos dos avós estarem consagrados no Código Civil, designadamente no Artigo 1887 onde se diz que “os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os irmãos e ascendentes”, do acórdão do Supremo de 1998 onde se pode ler que “os avós têm legitimidade para intervirem no processo de regulação do exercício do poder paternal”, e apesar de ser possível que os avós paternos, em caso de privação de contactos com os seus netos, instaurem uma acção judicial em que pedem um regime de convívio, isto requer uma acção concreta (e com custas judiciais) num direito que devia, por força de Lei, já estar incluído sempre (salvo circunstâncias excepcionais) na regulação do poder paternal, reduzindo assim a margem de interpretação ou de sensibilidade do juiz por forma a reduzir ao máximo o sofrimento da criança e dos próprios avós. A legislação deveria também contemplar a possibilidade da substituição dos progenitores pelos avós quando existe um nível de conflitualidade judicial muito intenso e quando há registo comprovado da utilização da regulação do poder paternal como um instrumento para promover a alienação parental e manter o nível de conflitualidade.
A bem da redução do sofrimento dos avós e das crianças: eis algo que devia estar na agenda do nosso Parlamento.