Respostas terapêuticas aos interesses sexuais atípicos
Ao longo dos anos, as investigações têm sido claras ao indicar que indivíduos que não são alvo de tratamento têm maior probabilidade de reincidência.
Do ponto de vista da sexologia clínica, os interesses sexuais poderão ser definidos como normativos ou atípicos, podendo estes últimos ter características desviantes e criminais. É possível encontrar pelo menos dois grupos distintos de interesses sexuais atípicos: indivíduos com interesses sexuais coercivos (ativação sexual quando está presente o uso da violência/coerção), e indivíduos com interesses sexuais por crianças (ativação sexual quando olham para o corpo de uma criança). Surgem nesta última tipologia os abusadores sexuais de crianças e pedófilos. Importa, no entanto, não confundir pedófilos com agressores sexuais de crianças. Apesar do abuso a vítimas menores, os abusadores de crianças não possuem uma preferência sexual específica por crianças pré-púberes. A principal razão de estes sujeitos abusarem sexualmente de crianças poderá passar, muitas vezes, pela substituição momentânea do/da seu/sua parceiro/a, tendo como alvo crianças mais desprotegidas, adolescentes sexualmente inexperientes, com deficiência mental, bem como crianças com problemas de comportamento ou com origem em famílias disfuncionais.
É também relevante considerar que muitos destes agressores apenas se aproximam de vítimas menores (habitualmente social e emocionalmente vulneráveis) por estas não terem capacidade de fazer nenhuma consideração sobre os défices sociais, emocionais e sexuais que o agressor apresenta, sejam eles visíveis ou percecionados. Por sua vez, indivíduos com interesses sexuais pedófilos apresentam uma preferência sexual exclusiva por crianças pré-púberes, ou seja, que não apresentam qualquer característica sexual secundária (por exemplo, inexistência de pelos púbicos), geralmente com idade inferior a 13 anos. Trata-se de uma perturbação mental, que se manifesta de forma persistente com pensamentos, fantasias sexuais e excitação sexual.
É também utilizada a denominação hebefilia para descrever a preferência sexual por adolescentes púberes (ou seja, com os primeiros sinais de desenvolvimento sexual), com idades tipicamente compreendidas entre os 12 e os 14 anos. Os interesses sexuais hebéfilos distanciam-se assim dos interesses sexuais pedófilos no sentido em que os primeiros são atraídos por crianças que apresentam alguns sinais de desenvolvimento sexual secundários, mas são sexualmente imaturas. A pedofilia e a hebefilia podem ser assim distinguidas da teleofilia que representa o interesse sexual por pessoas adultas, já sexualmente maduras.
Algumas investigações realçam que apenas alguns indivíduos com interesses sexuais pedófilos prosseguem para o contacto sexual com crianças e, com isso, para um episódio de agressão sexual. Desta forma, existem indivíduos com interesses sexuais pedófilos que restringem o seu desejo por contacto sexual com crianças a uma mera fantasia, enquanto outros correm o risco e cometem a agressão. Esta circunstância implica que é fundamental a aposta na prevenção dos crimes sexuais cometidos contra menores, possibilitando uma resposta clínica que reduza fortemente a probabilidade de recair. Ao longo dos anos, as investigações têm sido claras ao indicar que indivíduos que não são alvo de tratamento têm maior probabilidade de reincidência.
Desde 2019 que se encontra disponível em Portugal um programa destinado a ajudar pedófilos a controlar os seus ímpetos. Trata-se de um programa criado pela equipa de Klaus M. Beier, director do Instituto de Sexologia da Charité – Universidade de Medicina de Berlim, um projeto pioneiro, no qual um grupo de terapeutas (psicólogos e psiquiatras), em Lisboa e no Porto, se disponibiliza a intervir com adolescentes e adultos que sofrem de pedofilia ou hebefilia e que desejam ajuda para controlar impulsos, para nunca passarem à prática.
Encontra-se disponível igualmente uma outra ferramenta de autoajuda para quem sente atração por menores de idade e não tem acesso a terapia presencial, podendo recorrer a um sistema online (troubled-desire.com/pt/). Todas estas respostas porque este tipo de comportamentos exige prevenção e, felizmente, existem já recursos técnicos em Portugal que o permitem fazer.