Os pintores pintam, não falam, sobretudo nada têm a dizer quanto às telas que pintam. De facto, ninguém fala melhor de pintura do que os próprios quadros. No entanto há, direi felizmente, excepções ilustres de Leonardo a Matisse, a Picasso, a Klee. E agora Jorge Martins. Nos quadros, Jorge Martins proclama Pintura em voz alta, depois cala-se, reservando para os cadernos íntimos as inconfidências pictóricas, o mais das vezes sob a forma de aforismos, que são fulgurações de um instante em que uma verdade aparece ou uma dúvida ameaça. Nas mesmas páginas desenhos e apontamentos para novas telas. Para nossa fortuna, uma selecção destes 150 cadernos, de 1964 a 2020, são agora desvendados numa preciosa compilação bilingue (cerca de 700 páginas) promovida pelo MARCO, Museu de Arte Contemporânea de Vigo, onde no final de 2019 o artista fizera um ampla exposição de desenhos. O livro é publicado como um arquivo de fragmentos pela editora DOCUMENTA com o apoio da Fundação Carmona e Costa. Nestes Cadernos/Cuadernos oferece-se ao amador de arte (sujeito se calhar condenado a desaparecer), a possibilidade, rara, de entrar nos bastidores psicológicos do labor, das angústias e das alegrias quotidianas que precedem e acompanham o acto criativo.
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