As raízes judaicas açorianas de Jorge Sampaio

Parte de uma das ramificações dos Bensaúdes, há uma componente judaica, de origem açoriana, nas raízes familiares do recém-falecido Jorge Sampaio (1939-2021).

Há uma componente judaica, de origem açoriana, nas raízes familiares de Jorge Sampaio. Faz parte de uma das ramificações dos Bensaúdes, judeus sefarditas oriundos de Marrocos e que, no início do século XIX, se fixaram em Portugal. Primeiro no Algarve e nos Açores e, a seguir, em Lisboa e noutros pontos do País. Encontram-se ligados à navegação marítima, ao comércio, à indústria, à banca, à agricultura, aos transportes aéreos, à hotelaria e ao turismo. Podemos acrescentar: à investigação científica, à investigação histórica, ao magistério universitário, à literatura, às artes plásticas e à música.

Os Bensaúdes, em especial a segunda geração, reconhecidos a nível regional, nacional e internacional, descendem de José Bensaúde (1835-1922), já nascido em Ponta Delgada, amigo íntimo de Antero de Quental e pai de Alfredo Bensaúde, (1856-1941) fundador do Instituto Superior Técnico e da Universidade de Lisboa; Joaquim Bensaúde (1859-1952), historiador dos descobrimentos portugueses; Raul Bensaúde (1866- 1938), médico, professor da Sorbonne e que se especializou no tratamento pioneiro das hemorroidas; e, ainda, de Esther Bensaúde (1864- 1965), que pelo seu casamento também adquiriu o nome de Oulman.

Desta plêiade, que se evidenciou em vários domínios sociais e culturais, refira-se que Alfredo Bensaúde foi pai de Mathilde Bensaúde (1890-1969), precursora da investigação biológica; Joaquim Bensaúde pai de Vasco Bensaúde que prosseguiu os negócios em São Miguel; e de Esther Bensaúde Oulman avó do músico Alain Oulman (1928- 1990), um dos compositores favoritos de Amália Rodrigues.

Mas nos outros ramos dos Bensaúdes – cujo primitivo nome era Assiboni – destacam-se Aarão Mimon Bensaúde que, vindo dos Açores, se estabeleceu depois em Lisboa; e Shara Benlisman Bensaúde (1890-1976), que casou com o oficial da Armada Fernando Branco (1880-1940), introdutor dos submarinos em Portugal, adido naval de Manuel Teixeira Gomes na Embaixada de Londres e, de 1928 a 1933, Ministro dos Negócios Estrangeiros e Ministro da Marinha, em governos da ditadura militar.

Nasceram do casamento de Fernando Branco com Shara Benlisman Bensaúde duas filhas: Regina Bensaúde Branco e Fernanda Bensaúde Branco. Veio a casar Regina com o escultor António Duarte (1912- 1998), autor da peça escultórica na frontaria do Palácio da Justiça de Ponta Delgada. São pais do Prof. Dr Filipe Duarte Santos, diretor do Centro de Física Nuclear da Universidade de Lisboa e que, frequentemente, aparece na Televisão a esclarecer situações relativas ao ambiente e às alterações globais.

Quanto à outra filha, Fernanda Bensaúde Branco, casou com o médico Arnaldo Sampaio (1908-1984), que foi diretor do Instituto Ricardo Jorge, nasceram Jorge Sampaio (1939-2021), advogado e político, e Daniel Sampaio (1946), médico psiquiatra e professor catedrático da Faculdade de Medicina de Lisboa.

Jorge Sampaio, enquanto Presidente da Câmara de Lisboa, de 1989 a 1996 e, depois como Presidente da República, de 1996 a 2006, marcou a sua presença ou a sua representação institucional em manifestações relevantes da Comunidade Israelita de Lisboa, no decurso das presidências de Joshua Ruah e de Samuel Levy. Trata-se, resumidamente, em 1996, da cerimónia de grande repercussão Memória e Reencontro, a propósito do decreto da expulsão dos judeus, em 1596; da realização, no Centro Cultural de Belém, do Seminário Internacional Oceanos da Paz; e, em 2004, das comemorações centenárias da fundação da Sinagoga Shaare Tikah (Porta da Esperança), instalada em Lisboa na rua Alexandre Herculano.

Os Açores foram um polo de fixação e irradiação de famílias judaicas que alcançaram significativa projeção. Tais como as de Abraão Bensaúde, Salomão Sequerra Amram, Shalom Buzaglo, Arão Benayon, Isac Sentob, Abraham Benlisman, Fortunato Cohem, Salomon Bensabat, Moysés Benarus, Joaquim Zagury, Mimom bem Abraham Abbott e Abraham Sebag. Além do que mencionamos acerca dos Bensaúdes, avultam David Cohem (filho de Abraham Cohem, talmudista e cabalista) que, em Paris, foi secretário de Ernesto Renan; de Salomão Sáraga, membro do Cenáculo e com Antero de Quental um dos promotores das Conferências do Casino; e de José Sebag (1936-1989), jornalista profissional e um dos mais notáveis poetas do grupo Surrealista de Lisboa, autor do livro Planeta Precário e cujo espólio ficou depositado na Biblioteca Pública da cidade da Horta, ilha do Faial.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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