O direito é o pilar base de qualquer sistema democrático. É por ele e através dele que garantimos uma existência harmoniosa em comunidade, onde os direitos e deveres individuais são salvaguardados e ganham dinâmicas comuns dentro da sociedade.
Não existindo dúvidas em cada um de nós do papel do direito para a compreensão do passado, a execução do presente e a construção do futuro, é necessário apontar para uma clara disfunção do mesmo, no caso nacional. Em particular no que toca ao seu ensino.
É um sintoma claro do desequilíbrio na alocação de poderes reguladores e executores em Portugal a forma (também ela) desequilibrada onde se localizam as escolas de formação de direito no nosso país e o seu ecossistema envolvente.
Existem 15 escolas onde é possível um aluno candidatar-se para frequentar o curso de direito em Portugal. Das 15 escolas, 14 são no litoral. Das 15 escolas, a que não é considerada “no litoral” é a do Minho, situada num “ponto estratégico”, a 20 minutos de carro e comboio do Porto.
Das 15 escolas, 12 são localizadas em Lisboa e Porto. Das 15 escolas, mais de metade são de iniciativa privada.
A dicotomia existente entre litoral e interior, no que toca à formação de direito, é mais um aspecto na ideia de “elitização” da classe e do seu circuito fechado.
Entre renda, alimentação, transportes, material pedagógico, os custos inerentes para um aluno deslocado são tremendamente superiores e desequilibrados quando comparados com alunos locais.
Tal esforço financeiro e humano pode durar, no mínimo, seis anos (licenciatura e mestrado), tendo em conta a intenção da Ordem de alterar as condições de acesso, algo que mereceu a reprovação do Conselho Nacional de Estudantes de Direito, que emitiu um comunicado apontando ao incremento do insucesso e abandono escolar com tais medidas.
O que espera hoje a um aspirante a estudante que se encontra longe dos centros urbanos é um êxodo forçado, por um longo prazo, com dificuldades acrescidas (em todas as vertentes) para o sucesso.
A não-inclusão do curso de direito em território interior da Beira Baixa, aproveitando a disponibilidade da Universidade da Beira Interior (instituição de ensino superior de maior peso e com maior tecido humano), representa hoje falta de visão estratégica e dá um contributo forte à desigualdade entre os mais jovens.
Representa falta de visão estratégica pois a abertura desta valência, uma daquelas que cria, pela sua força e importância social, maiores efeitos na sua área envolvente, poderia ser um motor para a regionalização, promovendo a distribuição de órgãos de decisão centrais e pólos administrativos, para o interior.
É um contributo forte para a desigualdade pois obriga a que centenas de estudantes do interior do país se desloquem anualmente, por necessidade, para zonas de maior concentração económica e demográfica, sem terem vontade de o fazer e até, por vezes, posses para tal. O despovoamento por ausência de alternativa.
O direito foi sempre construído pela reivindicação e pela melhoria da sociedade, através de todos nós. Foquemo-nos nos mesmos princípios para impedir que mais nenhum jovem tenha que escolher entre mudar de área de residência ou área de estudo para ter direito ao interior.