O hábito de comprar raspadinhas e o medo de investir na bolsa

As raspadinhas são um jogo de sorte ou azar, enquanto os investimentos financeiros não são meramente baseados em probabilidade, mas sim em negócios reais, empresas reais, com capital, recursos humanos, infra-estruturas e muito mais.

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SEBASTIAO ALMEIDA

Porquê que “investimos” mais nas raspadinhas do que na bolsa de valores?

Existem factores rápidos que nos respondem a isto. É mais fácil entender como se joga nas raspadinhas:
1) Não existem análises financeiras, não existem contratos nem existem riscos económicos inerentes. É só raspar a raspadinha e ver se saiu algum prémio.
2) É mais fácil comprar uma raspadinha do que comprar acções. Não é necessário criação de conta e fornecimento de dados - para ter uma raspadinha basta ir à carteira e tirar 1 euro.
3) As raspadinhas dão oportunidade de ganhar mais dinheiro em pouco tempo, enquanto a bolsa de valores tem retornos mais lentos.

Além disso, todos nós gostamos da adrenalina de raspar para ver se é desta que ficamos “ricos”.

Raspadinhas e bolsa de valores têm o mesmo princípio: ao “investirmos”, acreditamos que vamos ganhar. No caso da bolsa, esperamos que uma empresa tenha um crescimento e que valorize. Na raspadinha, esperamos que um dos números saia e vencemos.

Steven Santos, director de corretagem do banco BIG, afirmou: “O dinheiro que se gasta por dia em Portugal com as raspadinhas, com os Euromilhões, se uma parte desse capital fosse canalizado para a compra de acções, as pessoas serem titulares de partes de empresas que inovam, crescem e têm capacidade de mudar as suas indústrias - isso teria muito melhor retorno para a vida das pessoas.”

Mas porquê que traria um melhor retorno para a vida das pessoas?

A longo prazo, podemos ter uma maior rentabilidade do capital investido, além do investimento que fazemos nas empresas e que pode acrescentar valor às mesmas. Se tivermos como exemplo o índice S&P500 (bolsa americana), este cresceu 39,77% desde Janeiro de 2020 até Janeiro de 2022. Podemos até retroceder mais alguns anos e ver o histórico desde Janeiro de 2010 até Janeiro de 2022, no qual vemos um crescimento de 304,95%, segundo a investing.com. Claro que existe sempre o risco de perda, mas também existe o risco de perda nas raspadinhas (a probabilidade de perda até é potencialmente maior), mas preferimos este jogo rápido, simples e instantâneo.

Segundo um estudo criado pela SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Substâncias) relativo ao período 2016/2017, cerca de 30% da população portuguesa compra raspadinhas, sendo que cada português que joga gasta, em média, cerca de 450 euros por ano.

As raspadinhas são um jogo de sorte ou azar, enquanto os investimentos financeiros não são meramente baseados em probabilidade, mas sim em negócios reais, empresas reais, com capital, recursos humanos, infra-estruturas e muito mais.

Não existe problema nenhum em jogar raspadinhas, desde que não coloque em causa a nossa saúde financeira e psicológica (o mesmo se aplica a investimentos em bolsa de valores), mas será que não teríamos uma economia mais competitiva e um melhor planeamento financeiro no que concerne ao indivíduo se o investimento fosse em empresas invés de jogos de sorte/azar?

A literacia financeira não é fácil, não é barata, mas pode dar milhões.

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