É um mundo de formigas e nós só estamos de passagem.
Uma nova estimativa para o número total de formigas a escavar e a zumbir pela Terra chega a um total colossal de quase 20 mil biliões de indivíduos. Esta soma surpreendente — 20.000.000.000.000.000 — revela a ubiquidade das formigas, mesmo que os cientistas estejam a ficar preocupados com uma possível morte em massa de insectos, o que poderia derrubar ecossistemas.
Num artigo editado esta segunda-feira, 19 de Setembro, pela Proceedings of the National Academy of Sciences, um grupo de cientistas da Universidade de Hong Kong analisou 489 estudos e concluiu que a massa total de formigas na Terra pesa cerca de 12 megatoneladas de carbono seco. Dito de outra maneira: se todas as formigas fossem arrancadas do chão e colocadas numa balança, o seu peso ultrapassaria o de todas as aves e mamíferos selvagens juntos. Por cada pessoa, há perto de 2,5 milhões de formigas.
“É inimaginável”, disse Patrick Schultheiss, autor principal do estudo e investigador na Universidade de Würzburg, na Alemanha. “Simplesmente, não podemos imaginar 20 mil biliões de formigas numa só pilha. Não funciona.”
Contar todos estes insectos — ou, pelo menos, o suficiente para conseguir uma estimativa sólida — envolveu combinar dados de “milhares de autores em muitos países” ao longo de um século, acrescentou Schultheiss.
Para contar insectos tão abundantes como as formigas, há dois métodos: pôr os olhos no chão para recolher amostras de manta morta — ou instalar armadilhas minúsculas (normalmente um copo de plástico) e esperar que as formigas caiam lá. Os investigadores sujaram as botas com pesquisas em quase todos os pontos do mundo, ainda que faltem dados de alguns locais em África e na Ásia. “Esses números resultam de um grande esforço global”, referiu Schultheiss.
As formigas, como os humanos, percorreram todos os continentes e todo o tipo de habitats. São mais abundantes em regiões tropicais e subtropicais, de acordo com a equipa de investigação, mas podem ser encontradas praticamente em todo o lado, excepto nas partes mais frias do planeta.
Ou como o aclamado autor e mirmecologista (cientista de formigas) E. O. Wilson uma vez disse: “Não importa onde vou — excepto, possivelmente, à Antárctida ou ao Árctico, e eu não vou lá porque não há formigas —, não importa o quão diferente é a cultura humana, não importa o quão diferente é o ambiente, há formigas.”
O mundo, na verdade, pode estar melhor graças a todas estas formigas. Ao escavar, ventilam o solo e arrastam as sementes, ajudando-as germinar. São alimento de diversos artrópodes, pássaros e mamíferos. Enquanto as formigas Camponotus são uma chatice para quem tem casa, as florestas estariam a abarrotar de madeira morta se não fosse pela capacidade de decomposição destes insectos destruidores de madeira.
Entomologistas estão a ver um declínio problemático nas populações de insectos, além das formigas, na Alemanha, Porto Rico, entre outros países. A destruição de habitats, os pesticidas e as alterações climáticas contribuem para este potencial, mas ainda a ser debatido, “insectocalipse”. Mais de 40% das espécies de insectos podem vir a extinguir-se, de acordo com um estudo de 2019, com as borboletas e os escaravelhos a enfrentarem a maior ameaça.
Os cientistas não têm a certeza se o número de formigas também está a diminuir. “Para ser honesto, não fazemos ideia”, afirmou Schultheiss.
Essa é a próxima pergunta à qual a equipa de investigação quer responder. “Ainda não tentámos mostrar esta mudança na abundância de formigas”, referiu, via Zoom, Sabine Nooten, ecologista de insectos e autora principal do estudo. “Isso seria algo para depois.”
Durante décadas, os cientistas têm olhado para criações de formigas em laboratório para testar teorias de comportamento animal. O cientista de formigas Wilson, que morreu no ano passado, usou os seus conhecimentos de formigas para ajudar a explicar a base genética para a cooperação entre animais e para destacar a grande biodiversidade merecedora de preservação.
Na década de 1990, arriscou um palpite em relação à população de formigas na Terra, com o colega Bert Hölldobler. A estimativa dos dois era de cerca de dez mil biliões — na mesma ordem de grandeza que este recente e mais rigoroso estudo aponta.
“No caso de E. O. Wilson, ele era simplesmente um homem muito inteligente”, apontou Schultheiss. “Ele sabia imenso sobre formigas e tinha uma forte intuição.”