“Eu não me vejo a trabalhar na mesma empresa até aos 44 anos. É algo que até me dá ansiedade porque e o mundo lá fora? E as outras oportunidades?”, diz Rafaela Castro, 24, que trabalha na área de marketing.
Rafaela trabalha desde os 15 anos e já passou por sete empregos. O tempo máximo em que ficou empregada foi um ano. A sua motivação é a procura por qualidade de vida, principalmente em ambientes que priorizam sua saúde mental.
Não é só Rafaela que pensa assim. Dados do Ministério do Trabalho e da Previdência do Brasil, de 2020, mostram que os jovens são o grupo que mais muda de emprego em menos tempo. Os dados indicam que, dos 9,96 milhões de jovens entre os 18 e 24 anos inquiridos, 24,4% (2,47 milhões) ficam menos de três meses no mesmo trabalho.
Em contrapartida, 4,26 milhões de pessoas entre os 50 e 64 anos permanecem no mesmo emprego por dez anos ou mais.
Só a geração Z (os nascidos entre 1995 e 2010) está nesse quadro? Não. O inquérito também mostra que 2,43 milhões de profissionais entre os 30 e 39 anos também mudaram de trabalho em menos de três meses.
Essa movimentação é conhecida como job hopping (saltar de emprego, em português) em que pessoas mudam de trabalho com frequência e de forma voluntária.
Para o psicólogo organizacional Lucas Freire, o job hopping vem com outros fenómenos do mundo trabalho como a demissão silenciosa e a grande demissão. Esses movimentos mostram os sinais de esgotamento das relações tradicionais de trabalho e uma busca por novas formas de se relacionar com o emprego.
Quais os motivos dessa movimentação?
- Olhando para o passado: era comum o trabalhador ter em mente que o emprego era a garantia para a estabilidade financeira e reforma. Mas, hoje, os jovens querem mais qualidade de vida e um emprego que dê sentido para sua carreira. Enquanto não encontram isso, não vêem problema em mudar, diz Lilian Cidreira, CEO na Future Minds, consultoria especializada em carreira, liderança e inteligência emocional.
- Falando em qualidade de vida. Os jovens procuram empresas com flexibilidade de horário para conciliar vida profissional com os gostos pessoais e desenvolver uma vida financeira que dê possibilidade para suas conquistas, diz Helenice Accioly, gerente de recrutamento e selecção na Nube (Núcleo Brasileiro de Estágios).
- Eles fazem essa mudança para ter autonomia, fazer aquilo que gostam e procurar novos desafios para não ficarem estagnados na carreira.
- Autonomia? Isso mesmo, para construir a própria rotina, ter voz e participação no trabalho e sensação de pertença no emprego.
- Efeito da pandemia? O job hopping não começou com a pandemia, mas foi potencializado pela crise sanitária. “Diante da fragilidade que a pandemia nos trouxe, procurar maneiras mais produtivas de viver tornou-se urgente. Será que vale a pena estar em determinadas condições de trabalho? Será que vale a pena a saúde mental ser comprometida?”, diz Freire.
Esta movimentação é má?
- Se o trabalhador prefere desistir em vez de se esforçar, sim. “Quando o profissional transforma essa vontade de mudar de emprego num comportamento, ele desenvolve a capacidade de se adequar à cultura da companhia”, afirma Cidreira. A ausência dessa capacidade pode gerar o efeito reverso: de ser demitido pela empresa, em vez de pedir demissão.
- Pode afectar a contratação. O recrutador pode ficar inseguro em contratar alguém que ficou pouco tempo nos empregos anteriores, além de ver a pessoa como alguém instável, diz Accioly.
Mas, tem um lado bom
- Cada empresa comporta-se de maneira diferente em relação às actividades de cada trabalhador e às missões e metas que desejam atingir. A pessoa que muda várias vezes de emprego consegue adaptar-se melhor a diferentes ambientes de trabalho, já que passou por diversas culturas corporativas.
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Gera autoconhecimento. As passagens nas empresas ajudam o profissional a entender quais caminhos quer seguir ou com quais ramos mais se identifica.
Job hopping é comum na área de... tecnologia
Porquê? “Temos mais vagas do que profissionais, o que chamamos de mercado em oferta. Quando isso acontece, as empresas buscam esses profissionais e oferecem melhores condições, o que faz com que a movimentação fique maior”, diz Mariana Torres, especialista em carreira e recolocação.
Não é para todos. Qual é o perfil?
- Pessoas que buscam aceleração na carreira;
- Pessoas inquietas e extrovertidas que gostam de mudanças;
- E mais... podem ser chamados de nómadas de carreiras, já que se deslocam de um emprego para o outro em busca de novos desafios.
Antes de mudar, pergunta-te
- Neste novo emprego terei oportunidade de desenvolvimento?
- Vou aprender coisas novas?
- Por que estou mudando?
- Será que o que me motiva a sair também não é uma realidade na empresa nova?
Exclusivo PÚBLICO/Folha de S. Paulo
Nota do editor: o PÚBLICO respeitou a composição do texto original, com excepção de algumas palavras ou expressões não usadas em português de Portugal