Na Páscoa, os coelhos são populares — mas nem por isso são boa prenda

Apesar de serem populares, os coelhos exigem cuidados específicos. As lesões traumáticas são um quadro clínico frequente — é quase injusto que sejam tão amorosos e que não os devamos abraçar.

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Quase mais populares do que Jesus Cristo Pablo Martinez/Unsplash

A Páscoa, tal como o Natal, é hoje uma mixórdia de simbologia cristã e pagã. Atrevo-me a dizer que o coelho, símbolo pagão da Primavera desde o século XIII, tenha ultrapassado Jesus Cristo em popularidade — ou talvez a tenha recuperado. Digo eu, que nunca me ofereceram uma estatueta de Jesus em chocolate.

Infelizmente, a popularidade sazonal dos coelhos traduz-se numa crescente tendência, também ela sazonal, de os oferecermos como presentes de época e, por consequência, do seu abandono ou morte por negligência. Há, inclusive, lojas de animais que fazem promoções quando a Páscoa se avizinha, não vão elas perder a oportunidade de vender o seu peixe — digo, coelho.

Regra geral, os animais não são boas prendas. O acto de adoptar ou comprar um deve ser tomado com plena consciência da responsabilidade que acarreta ter uma vida a nosso cuidado.

Tenho para mim que antes de oferecermos ou adoptarmos um animal devemos cultivar esse sentimento de responsabilidade com seres vivos menos exigentes, como as plantas. Eu, por exemplo, deixei que mais de metade das minhas plantas sucumbissem este Inverno, o que me leva a concluir que ainda não me posso permitir concretizar o sonho de ter um gato.

Dito isto, se gostarias de ter um coelho como colega de casa e queres saber do que precisas (além de tempo e dinheiro), cá estou para te ajudar na busca por informação.

Dá-lhes espaço

Os coelhos, ao contrário de espadas de São Jorge, são seres mais sensíveis do que a população pensa e é o desconhecimento dos cuidados que poderão precisar que acaba por levar ao seu abandono. A ideia de que só comem cenouras e podem passar a vida fechados numa gaiola está muito longe da verdade.

Apesar do tamanho, são animais altamente energéticos que precisam de correr e de saltar livremente. Enclausurá-los numa gaiola levará rapidamente ao desenvolvimento de problemas articulares e comportamentais, de pododermatite e de obesidade, além de uma vida infeliz. O ideal é que os coelhos tenham uma gaiola estilo master suite para se podem abrigar quando precisarem e onde podem ser treinados a urinar e defecar como os gatos.

Nada de abraços

Outro factor que motiva o abandono é o facto de estes animais serem comprados enquanto láparos (isto é, quando são pequenos) e revelarem personalidades e comportamentos inesperados quando atingem a maturidade sexual. A castração ou esterilização são sempre aconselháveis, uma vez que resolve este tipo de problemas comportamentais e evita o desenvolvimento de doenças do aparelho reprodutor. Estima-se que cerca de 70% das fêmeas não esterilizadas com mais de três anos desenvolvem tumores uterinos.

As lesões traumáticas também são um quadro clínico frequente, principalmente em coelhos recém-adquiridos. Estes animais são presas e comportam-se como tal, por isso, têm mais dificuldade do que outras espécies em sentirem-se seguros quando são colhidos do chão por um gigante equivalente a um prédio de 30 andares. Eu sei que é quase injusto que tenham evoluído de forma a serem tão amorosos e que não os devamos abraçar, mas esta instintiva mentalidade de presa leva a que muitos saltem incorrectamente de mãos e colos e acabem com fracturas ósseas ligeiras a fatais.

Alimentação

Outra coisa que deves ter atenção é à dieta, que deve ser maioritariamente composta por feno, componente crucial para a saúde digestiva e dental dos animais.

Os dentes destas adoráveis bolas de pêlo com orelhas estão em constante crescimento, o que por si só não será um problema se tiverem uma dieta adequada e/ou brinquedos que possam roer, fazendo o devido desgaste. O desalinhamento entre os dentes superiores e inferiores levará ao sobre crescimento, provocando dor, falta de apetite e perda de peso. Além disto, é importante incluir diariamente cerca de 30% de verduras frescas e ração de boa qualidade.

Se, mesmo depois da minha antipromoção pascal, continuas a querer adoptar um coelhinho vou confiar no teu bom senso. Aprofunda a tua pesquisa, procura a opinião de pessoas que tenham estes animais, investiga as clínicas veterinárias de animais exóticos mais perto de ti, avalia os potenciais custos e se tens as condições necessárias. Se chegares à conclusão de que talvez um animal tão high maintenance não é a melhor opção, obrigada por seres responsável e lembra-te que podes sempre consolar-te com um de chocolate.

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