Qual é a influência do ambiente no controlo de doenças? Olhe-se para a epigenética
Trabalho quer identificar alterações no genoma responsáveis pela agressividade de certas ferrugens, um grupo de fungos que deixa as folhas, por exemplo do trigo e do cafeeiro, com aspecto enferrujado.
O meu doutoramento estuda o controlo epigenético num grupo de fungos, as ferrugens. Mas começando pelo princípio, o que é epigenética?
Durante muito tempo pensou-se que todas as alterações que aconteciam num organismo, quer ele fosse um ser humano, uma planta ou um fungo, se deviam exclusivamente à sua sequência genética (sequência de ADN). Qualquer alteração seria devido a uma mutação (alteração no ADN), a uma inserção (adição ao ADN) ou a uma deleção (perda de ADN), que mudariam essa sequência e levariam a algumas mudanças como uma doença, uma variação no aspecto/comportamento do ser vivo.
A epigenética (“epi” significa em latim no “topo” e remete, neste caso, para “em cima da genética”) é um campo de estudo que explica a influência do ambiente na expressão de genes. Assim sendo, para ocorrer uma alteração num organismo não é necessário que para isso haja mudanças na constituição do seu ADN.
A forma como o genoma (o conjunto de todo o ADN de um indivíduo) é organizado – ou seja, a forma como o ADN é arrumado no núcleo das células – torna determinados genes mais acessíveis ou impede-os de serem expressos, sem, contudo, deixarem de estar presentes. Esta informação pode ainda ser transmitida às gerações seguintes.
Um exemplo epigenético clássico é o de dois gémeos idênticos expostos a condições diferentes. Estes gémeos contêm a mesma informação genética, mas se forem expostos a diferentes ambientes/hábitos de vida, vão expressar os seus genes de modo desigual e poderão desenvolver diferentes doenças ou até deixarem de ser tão semelhantes com o passar dos anos.
Estas alterações não ocorrem só nos humanos e são também responsáveis por obstáculos que afectam a vida dos próprios seres humanos, como as doenças das plantas.
O meu doutoramento foca-se no estudo do controlo epigenético de doenças de plantas causadas por um grupo de fungos: as ferrugens (porque as folhas ficam com um aspecto enferrujado).
As ferrugens afectam muitas plantas (hospedeiros) importantes para os humanos, como o trigo e o cafeeiro. Este grupo de fungos é muito especial, pois só sobrevivem em plantas vivas. Como tal, a planta geralmente não morre com a infecção, mas fica fragilizada e a sua produtividade baixa consideravelmente.
Desde sempre os patologistas vegetais (“médicos” das plantas) têm tentado ultrapassar a baixa produtividade causada pelas ferrugens ao melhorarem plantas para serem resistentes. Contudo, as ferrugens facilmente ultrapassam estas resistências. As infecções, por si só, geram stresses tanto nas plantas como nos fungos e num cenário, que já é bastante presente, de alterações climáticas, é de esperar que ocorram diversas modificações epigenéticas nestes fungos e nas plantas infectadas por eles que poderão levar ao agravar destas doenças.
O meu trabalho pretende identificar as alterações epigenéticas responsáveis pela agressividade de determinadas ferrugens. É um estudo pioneiro e que poderá ter múltiplas vantagens no que diz respeito ao controlo destas doenças e o conhecimento obtido poderá ainda ser utilizado noutros fungos capazes de causar doenças.
Aluna de doutoramento no Instituto Superior de Agronomia da Universidade de Lisboa