Só é activismo se incomodar

O activismo não é suposto adaptar-se às regras da sociedade nem é pretensão dos activistas manifestarem-se de forma que não dificulte a vida do resto das pessoas.

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Megafone P3: Só é activismo se incomodar LUSA/Antonio Pedro Santos
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Temos assistido nas últimas semanas a uma maior frequência de protestos, por parte de jovens activistas, contra a inacção climática. Estas manifestações têm sido recebidas, de modo geral, com antipatia e repúdio, e, de forma particular, com violência, nomeadamente dos condutores que arrastaram alguns destes jovens. Porque não há nada a fazer além de condenar veementemente quem abusa da força, interessa focar na reacção das outras pessoas, até porque estão em maior número.

Aqueles e aquelas que rejeitam qualquer eficácia das acções dos activistas pelo clima – infelizmente, têm sido muitos a fazê-lo na TV e nos jornais não pararam duas vezes para reflectir sobre o conceito de activismo. O activismo só funciona se causar incómodo. O activismo não é suposto adaptar-se às regras da sociedade nem é pretensão dos activistas manifestarem-se de forma que não dificulte a vida do resto das pessoas. Se assim fosse, não seriam activistas, mas sim conformistas.

Que a maioria das pessoas esteja atarefada com o quotidiano e não escolha a protecção inequívoca do meio ambiente como primordial até se pode compreender; agora, que grande parte das pessoas privilegiadas presente na comunicação social se revele tão reaccionária face à mensagem que estes jovens tentam passar é motivo de grande preocupação. Não serão, certamente, as pessoas de meia ou idade mais avançada as que vão sofrer as maiores consequências do clima, mas isso não justifica o relativismo total sobre esta matéria.

O impacto das alterações climáticas nos vários ecossistemas tem sido dramático. Com grande parte das economias mundiais entregues à produção e consumo em massa, não serão as grandes organizações, catalisadoras e beneficiárias desta doutrina económica, a encontrar alternativas ao modelo capitalista. E também não serão os Estados, pesadas máquinas burocráticas, raramente na vanguarda da mudança, a fazê-lo, ainda que constitucionalmente estejam obrigados a proteger os seus cidadãos.

O incómodo grito de alerta é, então, dado por quem? Pelos que sobram: os jovens, conscientes de que este ritmo extractivista de viver os privou do direito mais fundamental de todos – o direito à vida. Os jovens não querem aparecer, não deveriam estar a estudar ou a fazer outra coisa qualquer – estes jovens sentem uma urgência em mudar o status quo, muitas vezes à custa da própria saúde mental; o mínimo que poderíamos fazer era ouvi-los.

Por último, esta é mais uma amostra de que os direitos não são dados nem estão garantidos: luta-se por eles e conquistam-se. O verbo não é aleatório para que se conquiste um direito, alguém tem de deixar de o monopolizar. Isto tem acontecido numerosas vezes ao longo da história, desde o direito ao voto por parte das mulheres até ao fim das várias segregações raciais nos diferentes pontos do planeta. Agora que podemos olhar em retrospectiva, vemos o quão absurdo foi a posição de quem esteve contra estes avanços. O mesmo vai acontecer face aos protestos contra a inacção climática, isto, claro, se ainda tivermos planeta para o testemunhar.

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