Durante vários anos, só se imaginou a ser médica, a centrar os seus esforços a salvar vidas, mas a verdade é que o vinho já lhe corria no sangue. Sendo a família proprietária da adega Catena Zapata, na Argentina, e por mais que tivesse passado horas nas salas de emergências, o destino acabou por encaminhá-la para o mundo dos vinhos. Hoje, Laura Catena acumula os conhecimentos de ambas as áreas e diz estar convencida que tem “a obrigação de parar a desinformação em torno do vinho”. Critica o “ataque” que tem vindo a ser feito ao vinho e faz eco dos estudos que sustentam que até pode fazer bem à saúde. Mas faz questão de bater (e muito) na tecla da “moderação”.
“Há milhares de estudos que mostram uma correlação entre o consumo moderado de vinho e a redução, em 30%, de ataques cardíacos, acidentes vasculares cerebrais e até demência”, defendeu Laura Catena, perante a plateia da Wine Future, que está a decorrer em Coimbra. A médica contesta, assim, teorias como a que foi defendida pela Organização Mundial de Saúde – de que não existe nível de consumo de álcool que seja seguro para a saúde –, assim como os estudos “que comparam o impacto do consumo de vinho ao tabaco” [um estudo publicado na revista britânica BMC Public Health concluiu que ingerir uma garrafa de vinho por semana aumenta o risco de cancro na mesma proporção que fumar até 10 cigarros]. “Não há comparação”, vincou, fundamentando-se numa pesquisa publicada em 2008, que contabiliza a “contribuição” dos vários factores de risco de cancro, numa roda liderada pela alimentação (30 a 35%) e pelo tabaco (25 a 30%) – o álcool fica-se, segundo esta pesquisa, entre os 4 a 6%.
“Bebemos vinho há milhares de anos. Faz parte da dieta mediterrânica, cujos benefícios para a saúde estão provados”, notou Laura Catena. “O que nós, indústria do vinho, temos de fazer é educar para a moderação”, exortou, reparando que a quantificação do que é um consumo moderado “muda de país para país”: um copo para as mulheres e dois para os homens, nos Estados Unidos da América; até dez unidades de bebida (cada unidade corresponde a 100 ml) por semana, até duas bebidas por dia e um dia de abstinência por semana, em França. Ainda que não seja adepta de iniciativas como o October Sober, que implicam maiores períodos de abstinência, Laura Catena é adepta de que se cumpram alguns dias sem álcool e que se adoptem hábitos como beber um copo de água por cada copo de vinho.
Esta abordagem aos impactos do consumo de vinho marcou, esta terça-feira, o arranque dos trabalhos da Wine Future, encontro organizado pela ViniPortugal, juntamente com a Chrand Events USA, e que visa debater os principais desafios que se levantam ao sector a nível mundial. Entre as principais preocupações manifestadas está a redução do consumo de vinho a nível mundial, tendência que levou a organização deste encontro internacional a dedicar um painel à temática de como aumentar as vendas em tempos de incerteza.
Uma das estratégias apontadas passa por trabalhar junto dos mais jovens que, segundo foi referenciado, estão a optar por outras bebidas alcoólicas. “Dizem que o vinho é caro, difícil de entender e que é muito snobe”, referiu Liz Thach, autora e presidente do Wine Market Council, organização que estuda os hábitos e tendências de compra dos consumidores de vinho nos Estados Unidos da América. Liz Thach deu o exemplo de algumas parcerias que têm vindo a ser firmadas (e com sucesso) com vista a fazer chegar o vinho ainda a mais consumidores, ligando-o a marcas de moda, de gelados e até a uma escola de ballet.
Ganhar fãs e não apenas consumidores
As achegas para o crescimento do sector chegaram, também, de fora. Bruce Dickinson, vocalista dos Iron Maiden, tomou conta do palco do Convento de São Francisco com a sua história de vida. De estrela do rock a empresário detentor de uma marca de cerveja, foi o mote da sua intervenção na Wine Future, centrada na ideia de que é preciso transformar os consumidores em fãs. “O consumidor é a pessoa que pode chegar à loja, dar uma volta e ir embora. Um fã é alguém apaixonado por aquilo que estás a fazer”, explicou.
Foi por ser fã de aviões – paixão que lhe foi incutida pelo tio-avô – que Bruce Dickinson teve essa ideia “fora da caixa” de levar os Iron Maiden em digressão no Boieng 747 baptizado com o nome “Ed Force One”, aventura que “permitiu que os fãs [da banda] não se tornassem consumidores”. É esse mesmo princípio básico que tem vindo a aplicar na sua aventura no mundo das cervejas. Começou com a The Trooper, produzida em parceria com a cervejeira Robinsons, mas já soma outros rótulos, um deles com saquê japonês. Uma inovação que é ela própria o exemplo de que “por cada obstáculo, há uma oportunidade”, referiu, antes de contar que foi por causa de perder o paladar, enquanto lutava contra o cancro na garganta, que decidiu criar esta cerveja.