Estes pinguins da Antárctida têm sonos que duram quatro segundos

Comportamento de sono extremo documentado em pinguins-de-barbicha da Antárctida. As aves adormecem milhares de vezes por dia - durante quatro segundos de cada vez -, acumulando 11 horas por dia.

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Pinguim-de-barbicha (Pygoscelis antarctica) Kevin Schafer/ GettyImages
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Ao longo da costa rochosa e sem gelo da Antárctida, os pinguins-de-barbicha, aos milhões, formam colónias de reprodução movimentadas - caóticas, barulhentas e, sim, malcheirosas - todos os anos, pondo ovos em Novembro que eclodem no final de Dezembro e Janeiro.

Guardar os ninhos é um assunto sério para estes pinguins de tamanho médio, com aves marinhas predadoras chamadas moleiro-do-sul [skuas ou Stercorarius maccormicki] à espreita. Adormecer durante o trabalho pode significar a perdição dos ovos e, mais tarde, das crias. Mas esta espécie, segundo os cientistas, inventou uma forma engenhosa de dormir o suficiente sem comprometer a vigilância.

Os investigadores documentaram um comportamento de sono extremo nestas aves que não voam. Em vez de dormirem durante períodos prolongados durante o período de nidificação, as aves adormecem milhares de vezes por dia - durante apenas cerca de quatro segundos de cada vez - e satisfazem as suas necessidades de sono cumulativamente, acumulando cerca de 11 horas por dia.

"Mostram uma adaptação inesperada ao sono, um compromisso entre a necessidade de dormir e a necessidade de estar acordado", afirma o ecofisiologista Paul-Antoine Libourel, do Centro de Investigação em Neurociências de Lyon, em França, autor principal do estudo publicado na revista Science.

"Isto não foi documentado antes", disse o ecologista comportamental e co-líder do estudo Won Young Lee, do Instituto de Pesquisa Polar da Coreia, em Incheon.

Os investigadores recolheram dados sobre 14 pinguins que incubavam ovos numa colónia com cerca de 3000 casais reprodutores na Ilha Rei George, na Antárctida, em Dezembro de 2019. Eles mediram a actividade eléctrica no cérebro - evidência da actividade do sono - usando um método chamado electroencefalografia. Os investigadores também filmaram as aves e utilizaram outros dispositivos de bio-registo, como monitores GPS e acelerómetros, para seguir a sua localização e movimentos corporais.

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REUTERS/Ueslei Marcelino

Enquanto guardavam os seus ninhos, as aves de barbatana realizaram o que se designa por micro-sonos - interrupções da vigília por um período de meros segundos através do fecho dos olhos e da actividade cerebral relacionada com o sono - em média cerca de 10 mil vezes por dia e, por vezes, até 15 mil vezes. O sono ocorre quando estão de pé ou deitados.

O sono é um bem precioso para as pessoas e para todo o reino animal pelo seu valor restaurador e outros objectivos. Nas pessoas, os micro-sonos podem ser perigosos - por exemplo, durante a condução. O mesmo não acontece com os pinguins-de-barbicha.

"Os pinguins não apresentam qualquer consequência negativa óbvia da fragmentação do sono", afirma Libourel. "Uma vez que as aves se podem reproduzir e procurar alimentos de forma eficiente, acreditamos que a função do sono pode ser cumprida mesmo quando o sono é perturbado desta forma".

Lee disse que alguns outros animais podem usar estratégias de sono semelhantes, embora isso ainda não tenha sido documentado.

Os pinguins-de-barbicha têm esse nome por causa da faixa preta de penas sob o queixo. Os adultos medem entre 70 e 80 cm de altura e pesam entre 3 e 6 kg. São um dos pinguins mais abundantes na região antárctica.

Normalmente, permanecem com o mesmo parceiro reprodutor ano após ano, numa espécie de casamento. As fêmeas põem normalmente dois ovos num ninho circular feito de pedras, e as crias nascem cerca de 37 dias depois. Durante a nidificação, os machos e as fêmeas partilham as tarefas parentais, com um a guardar continuamente os ovos ou as crias enquanto o outro procura alimento no oceano gelado durante vários dias.

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EPA/FEDERICO ANFITTI

Durante a incubação, as aves predadoras atacam os ovos de pinguim, sobretudo na periferia da colónia. Os pinguins-de-barbicha também têm de defender os seus ninhos das intrusões de outros pinguins na colónia, que é muito povoada e cacofónica.

"É uma paisagem incrível - mutável, não tão fria, com uma temperatura média de cerca de 1 grau Celsius. Mas, por vezes, é muito ventosa, com queda de neve", disse Libourel.

"Como biólogo de campo, tenho observado os pinguins desde 2014. A colónia de pinguins está situada perto da costa. É bastante malcheirosa devido às fezes dos pinguins. Além disso, é muito barulhenta com os chamamentos dos pinguins", acrescentou Lee.