O sol de Inverno e a depressão sazonal
Há algumas dicas que podem ajudar a contrariar a falta de energia e alterações de humor típicas do Inverno, como a pessoa expor-se à nossa fantástica luz do sol (sem óculos escuros), de manhã.
Em conversa com os colegas com quem normalmente almoço, pedi ideias em relação ao tema que gostariam de ver discutido este mês. Muitos deles trabalham em áreas diferentes da minha, tais como cancro, imunologia ou biologia celular, pelo que há sempre alguma curiosidade científica em relação ao trabalho uns dos outros.
A dúvida que surgiu foi, qual a explicação da neurobiologia para nos sentimos mais cansados, com menos energia e de pior humor quando o Inverno chega, e os dias são mais curtos e menos soalheiros. Essa diferença entre o Verão e Inverno sente-se imenso em países como Portugal, onde a luz do sol abunda e estranhamos a sua ausência. No fundo, como é que o cérebro deteta a luz e de que forma isso afeta o seu funcionamento.
Ora bem, os ciclos de sono e vigília (atividade) são controlados pelos níveis de uma hormona, a melatonina, produzida pela glândula pineal, localizada no cérebro e que induz o sono; esta, por sua vez, controla os níveis de cortisol, outra hormona, que está associada aos períodos de atividade.
A melatonina é produzida em resposta à escuridão. Quando a luz diminui, especialmente à noite, a glândula pineal é estimulada a produzir melatonina. Por outro lado, a exposição à luz, especialmente à luz natural do sol, que é detetada por fotorrecetores especiais que temos na retina, induz o efeito contrário. A luz do dia suprime a produção de melatonina e estimula a produção de cortisol. Esta interação recíproca entre melatonina e cortisol é uma parte essencial do sistema circadiano, que ajuda a regular o ciclo sono-vigília e outras funções fisiológicas ao longo do dia.
Durante os meses de Inverno, quando os dias são mais curtos e a intensidade da luz solar é reduzida, a produção de melatonina pode aumentar mais cedo e permanecer elevada por um período prolongado. Esta alteração pode causar distúrbios no sono, fadiga e alterações no humor que contribuem para o desenvolvimento dos sintomas depressivos. Daí sentirmos mais sono e menos energia em dias mais escuros, o que depois vai também interferir com a capacidade de atingir um sono profundo de noite.
Os países cujos habitantes podem ser mais afetados são os escandinavos (Suécia, Noruega, Dinamarca e Finlândia), a Islândia, o Canadá, a Rússia e o estado do Alasca, onde os dias têm uma duração muito curta no Inverno. Procedimentos para diminuir o impacto destas alterações podem incluir a fototerapia, que envolve a exposição a uma luz artificial brilhante por um período específico todos os dias, muito comum nos países nórdicos, e aumentar a intensidade das luzes interiores em casa e no trabalho.
Esta terapia visa compensar a falta de luz solar natural e regular os a produção de melatonina e, por conseguinte, os padrões de sono. A manutenção de hábitos de vida saudáveis, como a prática regular de exercício físico, também ajuda a diminuir o impacto destas mudanças ambientais. Em casos mais graves, pode ser necessário ajuda médica e uma terapia adequada.
Em Portugal, há algumas dicas que podem ajudar a contrariar esta falta de energia e alterações de humor típicas do Inverno, como a pessoa expor-se à nossa fantástica luz do sol (sem óculos escuros) no início da manhã. Em alternativa, usar luz artificial forte de comprimento de onda mais curta (no espetro do azul/verde), o que vai suprimir a produção de melatonina e induzir um aumento de cortisol de forma mais eficaz do que luzes de comprimento de onda mais longos, como o vermelho. Isto vai aumentar os níveis de energia durante o dia e contribuir para um sono mais profundo à noite. Daí não ser aconselhável exposição a luzes azuis ou ecrãs antes de dormir, uma vez que interfere com a produção de melatonina, que é indutora de sono.
Na época festiva proponho que oiçam a melhor música improvável de Natal: “Fairy Tale of New York” dos Pogues, em homenagem ao vocalista e fundador Shane MacGowan que morreu recentemente; acompanhada da memorável lição de desencontros e reencontros de um músico fracassado no sublime O ano sabático do João Tordo, que podem (e devem) oferecer como prenda de Natal. Boas Festas!
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990