Dúvida: “Dói-me o joelho, amanhã vai chover!”, será que vai mesmo?

Apesar de não ser um tema consensual na comunidade científica, o conhecimento empírico associa dores nos ossos e nas articulações às variações da temperatura e da pressão atmosférica.

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As mudanças da pressão do ar afectam a tensão dos tecidos musculares SÉRGIO AZENHA / PUBLICO
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Quando existem antecedentes de lesão, as alterações de temperatura e da pressão atmosférica podem causar dor. Apesar de não existirem estudos científicos que associem de forma directa e clara estas dores às previsões da meteorologia, sabemos que esta estranha ligação é observada transversalmente em muitas famílias e vários consultórios médicos. E, se calhar, não é tão estranha assim.

Quando alguém sofre uma lesão, é normal ouvir a frase: “Vai ficar com um relógio para o resto da vida.” Certamente, não se ouvem apitos ao meio-dia, nem correm ponteiros num joelho fracturado. Mas, como a zona fica mais sensível, pode dar o sinal para alterações que de outra forma não seriam sentidas.

Na segunda metade do século V, já Hipócrates tinha em consideração as estações do ano quando tratava a saúde. No tratado Ares, Águas e Lugares do médico conhecido como “o pai da medicina”, chamava à atenção para as alterações meteorológicas e os seus efeitos na saúde.

Daí até à actualidade manteve-se a ideia de que o clima pode influenciar as nossas dores, especialmente nos ossos e nas articulações. Quantos de nós já ouvimos, principalmente pelos mais velhos, uma previsão meteorológica de alguém que tem por fonte o seu joelho? "Amanhã vai chover, dói-me o joelho."

"Não é um mito"

João Torres, ortopedista e professor na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, confirma ao PÚBLICO que esta crença popular “não é um mito”. Apesar de não existir uma comprovação 100% científica, o conhecimento empírico e o que se observa nos consultórios permite tirar algumas deduções.

“Se há ali algum problema, ou já houve, há mais água naquele tecido porque está inflamado, a pressão muda, o tecido expande e vai estimular nervos e pode causar dor”, explica o ortopedista. Este fenómeno ocorre apenas “quando há de base algum problema na articulação”, é por isso que é mais comum este tipo de dores ocorrerem em pessoas mais velhas.

Quando o ar está húmido é menos denso e a pressão atmosférica é mais baixa. Este fenómeno é, geralmente, sentido antes da chuva, que ocorre quando este ar é forçado para cima, arrefece e causa precipitação.

Historicamente, a mudança de temperatura e da pressão atmosférica “está muito relacionada com a existência de dores osteoarticulares, nomeadamente miofasciais (dores musculares regionais) e também articulares”, esclarece ao PÚBLICO Filipe Lima Quintas, especialista em Medicina Física e de Reabilitação.

As mudanças barométricas, isto é, da pressão do ar, afectam a “tensão dos tecidos”, acrescenta o coordenador de Medicina Desportiva do Hospital Lusíadas do Porto. Apesar de não existir “grande evidência a suportar”, pode inferir-se que “tecidos mais fragilizados e com maior rigidez, nomeadamente tecidos fibróticos e com lesões, podem ser mais susceptíveis a ressentir as alterações de pressão”. Estes tecidos mais fragilizados têm mais “dificuldade de adaptação, em termos da sua elasticidade”, por isso, as alterações causadas pelas oscilações do clima podem causar dor, explica o médico Fisiatra.

Filipe Limas Quintas sublinha, no entanto, que “há escassez de evidência científica” e que as hipóteses apresentadas são baseadas apenas na “percepção clínica e empírica”.

Não é normal estas dores ocorrerem em tecidos saudáveis, mas sim “nos doentes que têm dano estrutural”, constata também José Costa, médico da especialidade de Reumatologia ao PÚBLICO. Estas dores podem acontecer em doentes com osteoartrose, onde “existe diminuição da espessura, qualidade e elasticidade da rótula”, com sarcopenia, que advém com o tempo e com a idade e onde se dá uma “diminuição da capacidade física e muscular” nomeadamente nas articulações de carga, como o joelho e os tornozelos.

Então, a alteração da pressão implica o aparecimento de dores “quando existe antecedentes de uma lesão, como fracturas, tendinites, instabilidades da rótula ou uma artrose por desgastes”, enumera o médico ortopedista João Torres.

Para prevenir esta dor, aconselha José Costa, reumatologista na Unidade Local de Saúde do Alto Minho, deve “apostar no exercício físico orientado, aeróbico, com marcha e ganho de massa muscular”. Deve também optar por “um estilo de vida saudável e com uma dieta, nomeadamente no controlo de peso”. Isto, porque o peso corporal “tem uma influência muito grande, quer na parte muscular quer na capacidade física e até no ponto de visa da osteoartrose e do dano das cartilagens”, justifica o especialista.

Então, a previsão meteorológica de quem sente o joelho “a dar sinal” pode não ser assim tão descabida.

Texto editado por Andrea Cunha Freitas