O sentido de Estado de Miranda Sarmento, em exclusivo no Financial Times

Os caminhos de Mário Centeno e Joaquim Miranda Sarmento continuam a cruzar-se, mesmo quando nada o faria supor.

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O actual ministro das Finanças decidiu recorrer ao Financial Times para anunciar uma importante medida de estímulo económico, antes de a revelar ao país. Em exclusivo e em primeira mão. Nesta iniciativa, voltou a seguir os passos do anterior ministro das Finanças, Mário Centeno, que no início deste novo ciclo político cometeu o maior erro da sua vida política e comentou ao Financial Times que tinha sido convidado pelo Presidente da República para ser primeiro-ministro, tendo sido depois desmentido por Marcelo Rebelo de Sousa.

Mas Joaquim Miranda Sarmento – que também viu o presidente da TAP revelar ao Financial Times o seu modelo preferido de privatização da companhia aérea e depois ser admoestado pelo Governo – deu o seu toque pessoal no recurso ao jornal económico de referência na Europa. Foi desmentido por si próprio. E horas depois, corrigiu a medida em conferência de imprensa do Conselho de Ministros.

Às primeiras horas de Lisboa, o Financial Times (FT) titulou que “Portugal irá reintroduzir incentivos fiscais para estrangeiros qualificados”, a partir da entrevista que o ministro das Finanças teria dado ao jornal. Uma notícia replicada pelas redes sociais do Governo. E que significava que a AD iria recuperar uma medida que o anterior executivo de António Costa havia eliminado. Horas depois, o próprio ministro acabaria por esclarecer que a medida passa apenas por alargar a taxa de IRS de 20% a mais trabalhadores qualificados e não terá de ir ao Parlamento, dado que só é preciso regulamentar por portaria o incentivo fiscal que já existe para os profissionais de investigação científica. E, segundo o Observador, o anúncio da entrevista ao FT acabou mesmo por desaparecer das redes sociais do Governo.

Esta forma titubeante de comunicar a acção legislativa tem vindo a marcar os primeiros meses do novo ministro das Finanças e de toda a sua equipa. E ganha maior notoriedade sempre que se trata de medidas emblemáticas da acção governativa, como o aumento das pensões (que afinal era só do Complemento Solidário para Idosos, ainda em campanha eleitoral) ou a descida do IRS (com a apropriação da redução implementada pelo anterior Governo).

Nestes poucos meses, já é possível concluir que o actual ministro das Finanças parece confiar pouco nos interlocutores que pode ter na apresentação destas medidas, tendo em conta que praticamente não se disponibiliza para responder a perguntas de jornalistas em público ou para esclarecer as políticas do seu ministério em entrevistas a jornais portugueses. É uma escolha e um direito. Com efeitos apenas na falta de informação que os portugueses vão tendo sobre o que se passa nas Finanças.

Mas protagonizar um episódio como o desta quinta-feira – com a apresentação de uma medida para estimular a captação de trabalhadores qualificados que afinal não vai existir – tem consequências mais sérias para a imagem do país que governa.

Talvez não seja má ideia, para quem conduz os destinos do ministério mais decisivo do país, colaborar mais com quem tem como único objectivo esclarecer os contribuintes portugueses sobre as escolhas políticas que afectam as suas vidas. Não só porque é esse o sentido de Estado que se espera de quem ocupa o cargo mais importante no Terreiro do Paço, como também poderá contribuir para atenuar a inexperiência natural de quem se senta pela primeira vez em tão pesada cadeira da governação.

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