Aquíferos do Algarve em situação “muito crítica”, com tendência para se agravar

Dos 22 aquíferos na região, 52% estão em “estado muito crítico”. Investigadores do IST propõem ferramentas para monitorizar e gerir as massas de água no subsolo. A intrusão salina é uma das ameaças.

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Ponte na ribeira de Algibre, por onde passa o principal aquífero da região Querença/Silves, sem água em Fevereiro de 2018 por causa da seca Sebastião Almeida/ARQUIVO
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A situação dos aquíferos no Algarve é “crítica”, mas a grande preocupação é que não se sabe com rigor qual o volume de armazenamento de reservas hídricas disponíveis no subsolo. A Agência Portuguesa do Ambiente (APA), em meados do mês passado, divulgou que 52% das massas de água subterrâneas se encontravam “em estado muito crítico”.

Os cortes de água previstos para o Verão, entretanto, foram aliviados. A pluviosidade durante o período de Janeiro a Abril, divulgou a APA, fez aumentar os níveis das barragens em mais 84hm3. Por isso, o Governo, através da Resolução do Conselho de Ministros (n.º80/2024), entendeu que a situação não se afigurava tão dramática quanto os cenários que estavam traçados no início do ano. Por conseguinte, os cortes à agricultura reduziram-se de 25% para 13%. O turismo/golfe e sector urbano, que sofriam reduções de 15%, passaram para 13% e 10%, respectivamente.

Os dados disponíveis indicam que os níveis do sistema de aquíferos (22 massas de águas subterrâneas) se encontram “extremamente baixos”, uma situação que só encontra paralelo com a grande seca de há duas décadas. O assunto tem vindo a ser estudado nos meios académicos, mas a verdade é que os recursos são cada vez mais escassos e os consumos continuam a aumentar.

Numa óptica prospectiva, o Departamento de Engenharia de Recursos Minerais e Energéticos (DER), do Instituto Superior Técnico (IST), apresentou nesta sexta-feira às entidades regionais com responsabilidade nesta área um sistema de monitorização e gestão capaz de, “em poucos anos”, fornecer elementos “com elevada precisão” para tomar decisões quanto à melhor forma de gerir as reservas. O maior aquífero da região (Querença-Silves) está a bater no fundo, e já dá sinais de intrusão salina nas zonas mais próximo do litoral, no perímetro de rega Silves/Lagoa.

A equipa do DER, na reunião tida com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve e com a APA, apresentou um projecto de investigação e desenvolvimento com ferramentas que irão permitir a “recolha e tratamento sobre todos os dados disponíveis sobre o comportamento do aquífero”.

O objectivo, lê-se no documento, é permitir que as decisões estratégicas quanto à utilização da água possam ser tomadas com base em “evidências científicas”, tendo em conta os cenários que apontam para uma aridez cada vez mais acentuada no Sul do país.

No que diz respeito às águas superficiais – principal fonte de abastecimento do consumo urbano – o Governo, através de uma resolução do Conselho de Ministros, lembrava: “Desde Maio de 2022 que os níveis de armazenamento de água nas albufeiras situam-se abaixo dos 50%.”

Na sequência desse alerta, o Turismo de Portugal foi autorizado a investir um milhão de euros numa campanha de publicidade, para a poupança de água, que está no ar, mas não teve ainda efeitos visíveis. Os empreendimentos turísticos continuam com os espaços relvados, como se a crise dos recursos hídricos não existisse.

No curto prazo, a APA garante o abastecimento público até final do ano, a partir das reservas das albufeiras. As dúvidas surgem em relação ao futuro, em que se prevê um aumento do número crescente de camas turísticas e de área de pomares de regadio, embora com sistemas de rega mais eficazes.

A empresa Águas do Algarve recebeu, entretanto, luz verde do Governo para adquirir serviços e lançar obras no valor de 5 milhões de euros, com vista ao alargamento da rede de rega com águas residuais tratadas que, actualmente, não chega aos 4% do volume de efluente produzido.

O presidente das Águas do Algarve justificou há quatro meses as dificuldades em cumprir as metas da reutilização. “Mais de metade dos efluentes das Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) está contaminada pela intrusão salina. De um volume de 40 milhões de metros cúbicos, 24 milhões não podem ser usados na rega.” O Plano de Eficiência Hídrica, com um financiamento de 237,4 milhões de euros pelos atrasos que leva corre o risco de não ser aplicado e de Bruxelas vir a exigir a devolução do dinheiro.