O sucesso das escolas em meios desfavorecidos: proximidade, dedicação e motivação
As escolas de meios desfavorecidos que conseguiram bons resultados estão predominantemente localizadas em pequenas cidades de baixa densidade populacional, em particular no Norte do país.
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Os rankings do secundário que hoje se publicam ordenam as médias dos exames nacionais, retratando as aprendizagens de alunos com ambições académicas. Em vez de um barómetro absoluto da qualidade do ensino em determinada escola, estes rankings servem como um ponto de partida para uma análise mais profunda, especialmente quando se trata de escolas em meios desfavorecidos.
O ranking da superação do PÚBLICO mostra de forma inequívoca que o sucesso das aprendizagens não é exclusivo das escolas privadas nem das escolas que recebem alunos provenientes de classes médias e altas. Há escolas inseridas em meios particularmente desfavorecidos (baixa escolaridade dos pais e elevada percentagem de alunos com apoio social) a fazer um trabalho notável e a alcançar feitos dignos de destaque:
- Impulsionam uma cultura de ambição académica, motivando uma percentagem relevante dos seus alunos (30% e 50%) a realizar os exames nacionais. Isto demonstra um trabalho excecional de incentivo e apoio, abrindo portas para o ensino superior e mobilidade social para alunos cujos pais têm baixa escolaridade.
- Potenciam o desempenho individual, dado que os alunos de topo alcançaram notas elevadas. Em praticamente todas as escolas desfavorecidas a nota mais alta nas provas foi superior a 18 valores, estes alunos poderão ingressar nas suas primeiras escolhas de curso superior, realizando em pleno o seu potencial académico.
- Promovem o desempenho coletivo ao atingir médias que se aproximam das melhores escolas em meios favorecidos. Por exemplo, a Escola Secundária de Arcozelo, apesar de operar num meio desfavorecido, obteve uma média de 13,23 nos exames nacionais, ficando a apenas 0,5 pontos da média da escola pública mais bem classificada, a Escola Artística António Arroio em Lisboa (13,76), por sinal classificada como inserida em meio favorecido.
Dos dados emana ainda um padrão regional e de malha urbana. As escolas de meios desfavorecidos que conseguiram bons resultados estão predominantemente localizadas em pequenas cidades de baixa densidade populacional, em particular no Norte do país. No extremo oposto, as escolas cuja envolvente impede os bons resultados localizam-se em zonas suburbanas especialmente em torno de Lisboa e Setúbal. Estas discrepâncias podem sinalizar a existência de benefícios que advém da proximidade entre a escola e as comunidades, da existência de laços fortes com a escola e do comprometimento do corpo docente.
Como universalizar o sucesso é a pergunta que vai ficando pendurada. A educação é feita de pessoas e a escola pública incorpora toda a diversidade humana e social. Fazer mais e melhor implica estratégias de valorização e apoio aos professores, diversificação do corpo docente, investimento em profissionais especializados em orientação comportamental e profissional e na ligação às comunidades.
Governos, municípios, comunidades escolares e academia devem trabalhar em conjunto para que se possa desenvolver políticas diferenciadas para escolas que são muito distintas umas das outras, permitindo que haja mais decisão de proximidade e que se possa encontrar recursos financeiros e humanos adequados a cada realidade.
Os dados agora publicados permitem-nos fazer um retrato do ano anterior, que deverá ser utilizado para desenhar programas e políticas que permitam manter o sucesso dos que se distinguem e estimular as escolas onde as dificuldades permanecem. De nada serve este esforço de informação se não for utilizado para olhar o futuro.
No futuro o cenário é de dificuldades agravadas para substituir professores — cerca de um em cada três professores ir-se-á reformar até ao final da década e o número de novos formados é francamente baixo. Como aproveitar a oportunidade de renovação para trazer novas ideias e perfis funcionais para o seio das escolas, em particular das escolas que se encontram localizadas em meios mais desfavorecidos. O debate em torno da sustentabilidade do sistema de educação português será incontornável. Talvez seja possível maior proximidade, dedicação e motivação — em momentos de crise tendemos a juntar esforços.
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico