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Marco Lessa: “O mercado da saudade é uma grande oportunidade”
Feira internacional que se estende até domingo na capital belga privilegia mercadorias de pequenos produtores brasileiros, que têm preocupações com a preservação do meio ambiente.
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Trazer o resultado do trabalho do pequeno produtor do Brasil para o mercado europeu. Esse é um do objetivos do empresário brasileiro Marco Lessa, CEO do grupo M21. Ele criou em terras portuguesas a Casa Brasiliana e está apresentando a feira Brasil Origem Week em vários países da União Europeia. Nascida no Brasil e com uma edição já realizada em Vila Nova de Gaia, em Portugal. O evento, que reúne gastronomia, moda, arte e cultura, chega nesta sexta-feira (06/09) a Bruxelas, na Bélgica, com uma vasta programação até domingo. O local escolhido é a emblemática Grand Place, no centro da cidade, que é considerada a capital da UE.
A ideia das feiras internacionais nasceu a partir de um estudo realizado pelo empresário com o objetivo de entender como era a presença do Brasil nas ações comerciais e promocionais no exterior. Ele constatou que o modelo de apresentação do país ante o mundo estava ultrapassado. Eram missões de negócios frias, com apresentações musicais e amostras de alguns produtos. A competição entre os países nesses eventos é muito acirrada, com todos disputando a atenção dos potenciais clientes. Lessa, então, criou um evento mais ousado e atrativo para os negócios, com muita brasilidade, música e culinária.
Além dos projetos itinerantes, instalou, em Vila Nova de Gaia, a Casa Brasiliana. Um showroom permanente, onde qualquer visitante pode conhecer e comprar produtos brasileiros, dos mais diversos. Serve principalmente como cartão de visitas para empresários interessados em conhecer os produtos made in Brazil e de ponto de partida para contatos comerciais. Isso a um custo muito mais baixo do que fazer um deslocamento até a América do Sul.
A fim de fazer a cadeia produtiva funcionar para os pequenos produtores, Lessa salienta a importância para que se organizem em cooperativas. Ele já está trabalhando com a União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes) e acredita que essa é melhor maneira para o pequeno produtor ganhar em escala. Isso passa pelo cuidado maior com a embalagem e a qualidade do produto exportado para a Europa, o que o torna apto para atender qualquer supermercado ou rede de distribuição em todo o Brasil.
A segunda Brasil Origem Week em território europeu está instalada no Le Maison du Cygne e terá degustação de comidas típicas brasileiras, entre muitas outras atrações. Lessa conversou com o PÚBLICO Brasil diretamente da capital belga.
O que esperar desse evento em Bruxelas?
É o primeiro ano na cidade. Tivemos a ousadia de começarmos esse projeto na Grand Place, em um palacete espetacular. A intenção é chegar de uma forma onde as pessoas enxerguem o Brasil como o país deve ser enxergado, com respeito, desejo, admiração, carinho e com muita alegria. Montamos uma estrutura para apresentação de música brasileira, bossa nova, samba, maracatu e carimbó. Nossa intenção é fazer bonito.
Como está a programação?
O destaque fica por conta dos estados da Bahia e do Pará, com grandes stands. O Pará, região amazônica, apresenta produtos como tucupi, um caldo aromático, derivado da mandioca, com um sabor forte e único, além do mundialmente conhecido açaí. Da Bahia, o estado brasileiro com maior influência africana, temos acarajé, vatapá e vários outros produtos. Pará e Bahia são os estados que mais produzem cacau no Brasil, base da fabricação de chocolate, uma paixão belga.
O que é a Brasil Origem Week?
A partir de um estudo para entender como era a presença do Brasil fora do Brasil, chegamos a algumas constatações. Dentre elas, de que o país fazia missões comerciais muito frias. Eram basicamente negócios, algumas apresentações culturais e amostras de produtos. Então, procuramos criar toda uma atmosfera com o que temos de melhor e, principalmente, com a diversidade que o Brasil tem. Trazemos gastronomia, música de qualidade, cultura, artes plásticas, fotografia e moda. Tudo com muita brasilidade. Um Brasil que a gente tem orgulho. Todos esses ativos brasileiros trazem reputação e prestam seu diferencial de um para o outro. Ganha o Brasil, ganham os produtores brasileiros. Depois da Bélgica, teremos, ainda neste ano, edições em Paris (1 a 3 de novembro) e Madri (15 a 17 de novembro).
E a Casa Brasiliana?
A Casa Brasiliana é um showroom de produtos brasileiros. Funciona como loja onde os produtos podem ser vendidos ao consumidor, mas, sobretudo, como um local para atrair compradores da Europa. É a oportunidade de comprar produtos brasileiros a um custo muito menor. Não tem o alto custo do transporte entre os continentes. Destaco que são produtos de pequenos empreendedores, agricultores familiares, empreendedores de moda e de arte, que produzem em uma escala menor, mas com muita qualidade, e que respeitam os princípios da sustentabilidade. Temos uma loja física e levamos uma amostra dela para outros lugares, como para Bruxelas. Tudo inserido dentro das comemorações do dia da independência do Brasil, o Sete de Setembro.
Em relação à agricultura familiar, como está presente na feira?
Na Bahia, temos uma relação muito próxima com a cadeia produtiva do cacau, porque já realizamos o Chocolat Festival em Ilhéus há 15 anos. A nossa intenção é ampliar e trazermos produtos de outros estados do Brasil. Já estamos conversando com Minas Gerais, Acre e outras unidades federativas do Nordeste. A própria Unicafes, que é uma entidade que reúne cooperativas da agricultura familiar do Brasil, está fazendo essa articulação para trazermos café mineiro premium. Enfim, ampliar um pouco mais a base dos produtores.
O pequeno produtor ganha mais com isso?
Quando o pequeno produtor se une para exportar, também está se preparando para vender melhor no Brasil. Há um cuidado maior com a embalagem, com a qualidade do produto. Há todo um preparo para exportar para a Europa, por exemplo. E, a partir disso, você está apto para atender qualquer supermercado ou rede de distribuição no Brasil inteiro. O produto continua artesanal, sendo elaborado com todo o cuidado, mas também atendendo as exigências de uma mercado maior.
A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) pode ajudar?
A agência já está nos apoiando institucionalmente e, em 2025, esperamos contar também com apoio para ampliar o trabalho da Casa Brasiliana. Já nos reunimos aqui em Bruxelas com o chefe do escritório da ApexBrasil, Aloysio Nunes Ferreira. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou claro seu posicionamento em estimular a exportação dos pequenos produtores, principalmente do Norte e do Nordeste, algo que nunca foi muito bem trabalhado no Brasil. E isso vem mudando. Creio que as metas do governo federal e o trabalho que a Apex pretende desenvolver estão alinhados com o que pretendemos fazer.
A Casa Brasiliana vai ser cada vez mais um hub de produtos brasileiros?
Cada vez mais. No próximo ano, vamos fazer rodadas de negócios na Casa Brasiliana em Vila Nova de Gaia uma vez por mês. Portanto, teremos 12 cadeias produtivas durante o ano. Sendo ativadas e conectadas com compradores da Europa. Além, claro, dos eventos, da participação em feiras e da realização das nossas próprias feiras. Em 2025, devemos ampliar a Brasil Origem Week para a Alemanha e a Itália com cultura, economia, investimento, promoção do turismo, exposição de produtos e marcas.
Como trazem esses produtos para a Europa?
Neste ano, trouxemos um contêiner de produtos para Portugal e estamos planejando o próximo. Para essa segunda operação, estamos avaliando o resultado do primeiro, analisando quais produtos tiveram maior aceitação. A nossa intenção é que, nos próximos 90 dias, estejamos trazendo um novo lote de mercadorias.
O senhor saiu do Brasil para viver em Portugal, como está sendo a vida de imigrante?
Sinto-me muito confortável. Eu e minha família moramos em Braga e, em dezembro, nos mudaremos para Vila Nova de Gaia. Eu diria que é como se o Brasil fosse o maior distrito português e Portugal fosse um dos grandes estados brasileiros. Digo sempre que Portugal pode deixar o Brasil melhor e o Brasil pode deixar Portugal maior. Eu me sinto incrivelmente bem recebido, carinhosamente bem tratado.
Onde o senhor nasceu?
Nasci no sertão da Bahia, morei em Salvador e passei minha vida em Ilhéus e viajei o Brasil inteiro. Conheci um Brasil de sotaques, de gírias. É um Brasil tão vasto que, quando vamos ao Sul, escutamos uma frase e não conseguimos entender absolutamente nada. Sinto um pouco isso aqui. Há limitações, pois, afinal de contas, ainda não sou cidadão. Mas isso não chega a ser um empecilho, porque estamos em família, todos legais. Me sinto um luso, literalmente.
E a comunidade brasileira em Portugal?
Já somos quase 600 mil brasileiros aqui e, daqui a pouco, podemos ser um milhão a viver em Portugal. É uma comunidade muito interessante para trazer negócios e produtos. As motivações foram distintas: busca por qualidade de vida, oportunidade de negócios, aposentadoria, trabalho, entre muitas outras. Mas, uma coisa é certa, todos têm saudade de onde nasceram. Por mais que também tenham saído felizes ou nem tanto do Brasil. A saudade é um ponto comum. E essa saudade é de tudo. Da música, da comida, da arte. Saudade de falar com outros brasileiros.
E há o mercado da saudade?
Quando você tem uma comunidade que é quase 10% da população de um país, há um enorme potencial de consumo. É o mercado da saudade. Agora, imagine uma Europa da saudade, onde a logística é muito mais barata e fácil para outros 26 países. Então, se enxerga Portugal como uma oportunidade. Tem que se pensar aqui como um hub para o restante da Europa. Eu não tenho dúvida disso. E muitas pessoas e empresas já compreendem isso a partir do Brasil.
E os produtos não são consumidos apenas por brasileiros.
De forma alguma, e os exemplos são cacau e açaí. Não são apenas 10% da população que consomem. O próprio português gosta de açaí como um produto relacionado à saúde. Então, são 10% da saudade e muito mais gente. É uma população grande, que gosta de experimentar. Não podemos esquecer de uma coisa pouco falada: a maior comunidade estrangeira do Brasil é a portuguesa. É uma conexão, não é só uma ação histórica. Essa conexão é muito importante.