Os sinais, em silêncio, faziam parte do dia-a-dia, camuflados pelo stress. A irritação, por vezes descontextualizada, alertava que algo existia, apesar do estado de negação. Descobri que, afinal, os sinais negados eram evidência de que fui apanhado pelo burnout. Sobra a pergunta: e agora?
Apesar da pouca clareza nos sintomas, o caminho nem sempre foi silencioso. O tempo, dividido entre o profissional e todas as outras áreas, era preenchido ao máximo, como um tampão de sintomas. Mas a estagnação e a falta de reconhecimento profissional eram o relógio de uma bomba pronta a explodir. Não faltaram avisos e algumas reacções pontuais, mas o excesso de positivismo causava uma negação constante das evidências.
Foi ao trocar a capital pela cidade dos arcebispos que as coisas ficaram mais evidentes. A mudança repentina de vida e habitat propiciou a mudança forçada de hábitos e o fim das ocupações que me iam mantendo sereno. A falta de escapes levou a uma maior entrega e responsabilidade profissional. Já o reconhecimento dessa entrega e responsabilidades ficou sempre aquém. Subsiste a noção de que quanto mais trabalho e produzo, maior a minha estagnação profissional. Isso suscitou dúvidas quanto à minha qualidade profissional.
As dores de cabeça, o cansaço matinal sem razão e as alterações de humor eram constantes. A incapacidade de me concentrar em tarefas mais exigentes e a falta de vontade de estar naquele espaço tornaram-se um alerta. As tarefas simples eram motivos de irritabilidade, a falta de paciência era crónica. A tensão alta empurrou-me para a medicação. A vida deixou de ser simples — os meus pensamentos eram movidos pela ansiedade. Os conflitos internos deram lugar a constantes conflitos externos. Os pensamentos atropelam-me diariamente e motivam isolamento social.
Quando estou no trabalho, sinto que ali não é o meu espaço. Independentemente do que faça, dos conhecimentos profissionais que já tenho, não existe vontade de melhorar e o desespero da idade não deixa pensar de forma diferente. São duas décadas perdidas profissionalmente. É como estar numa roda em que, por mais que corra, não saio do mesmo sítio. Estou a correr para nada. Talvez por isso, a ideia de cumprir os mínimos olímpicos chegue para um dia de trabalho.
Os prejuízos do burnout na vida não se limitam ao universo profissional. Afectam a vida, as relações humanas, o bem-estar emocional e físico de forma negativa e, se não for reconhecido a tempo, destrói.
Resta agora, com os cacos que sobram, tentar resgatar o que ainda posso fazer, procurar o lado positivo, reequilibrando a minha vida. Fazer as coisas valer a pena.