Investigação aos graffiters do Padrão dos Descobrimentos está parada há ano e meio

Pedidos de colaboração feitos por Portugal às autoridades francesas têm caído em saco roto, embora suspeitos estejam identificados desde a primeira hora.

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Inscrição feita por grafitter que assinou como Lia custou 2300 euros mais IVA António Cotrim/ LUSA
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Está parada há ano e meio a investigação destinada a punir os graffiters que vandalizaram o Padrão dos Descobrimentos fez no mês passado três anos. Não porque a sua identidade seja desconhecida, mas porque os pedidos de colaboração do Ministério Público português às autoridades francesas têm caído em saco roto. Seja como for, o crime de dano patrimonial só prescreverá em 2031.

Foi a 8 de Agosto de 2021 que a estudante francesa Leila Lakel se vangloriou da proeza nas redes sociais, partilhando um vídeo da mensagem grafitada no monumento, em inglês: “Navegando cegamente por dinheiro, a humanidade está a afundar-se num mar vermelho”. A seguir despediu-se: “Está feito. Adeus Lisboa.”

Foi por um escasso par de horas que a Polícia Judiciária deixou escapar de Portugal a artista, que assina como Lia, e o seu namorado, que com o cognome de Flask deixou dezenas de pichagens em locais tão distintos como o estádio do Sporting, o Campo das Cebolas, as Escadinhas de São Crispim, o jardim da Cerca da Graça e os elevadores históricos. O casal alugou um pequeno apartamento em Alfama entre Janeiro e Agosto de 2021. Foram-se embora no dia a seguir à sua obra no monumento de Belém ter sido descoberta. À hora a que o voo low-cost em que embarcaram rumo a Nantes deixou o solo português os inspectores chegavam ao bairro lisboeta à sua procura. Não terem sido avisados da ocorrência logo a seguir à descoberta da pichagem pode ter feito a diferença.

A remoção das inscrições no monumento de Belém, que não é monumento nacional - a direcção-geral só abriu o respectivo processo de classificação em Junho de 2023 - custou 2300 euros mais IVA. Mas a actuação do casal teve outros custos: a Carris fala numa despesa superior a nove mil euros para limpar os ascensores, e a Câmara de Lisboa apresenta facturas que rondam os dez mil, valores a que se somam os despendidos por um hotel situado junto ao elevador da Glória que viu as suas paredes e cantarias atacadas durante a pandemia. Estimada em mais 2500 euros, a limpeza não resolveu por completo a pichagem das áreas de pedra.

Até agora o casal não foi constituído arguido. A procuradora titular do inquérito no Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa sempre se recusou a pedir um mandado de detenção europeu para os suspeitos, por achar a medida sugerida pela Polícia Judiciária desproporcional e demasiado lesiva dos seus direitos, liberdades e garantias.

Não acreditando que lhes venha a ser aplicada cadeia efectiva, preferiu optar por um mecanismo que dá pelo nome de Decisão Europeia de Investigação, através do qual pediu às autoridades francesas que constituíssem os suspeitos arguidos e os interrogassem sobre as pichagens. Fê-lo ano e meio depois de o monumento ter sido vandalizado. Estão em causa crimes de dano simples e de dano qualificado, no caso dos elevadores, que estão classificados como monumentos nacionais, o que teoricamente dá direito a uma pena de prisão de dois a oito anos.

Desde Março do ano passado que a magistrada pergunta periodicamente às autoridades francesas se já interrogaram o casal, que, segundo as últimas moradas conhecidas, vive em locais distintos – se é que o casal ainda existe enquanto tal: ele em Paris, ela em Narbonne, no sudoeste de França. Ainda não, têm-lhe respondido, sem justificar porquê.

Em 2022 houve notícias de que Leila Lakel, que é de origem magrebina, teria voltado a estar em Portugal, uma vez que não lhe foi decretado nenhum impedimento legal nesse sentido.

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