Capacetes Brancos na prisão de Sednaya após rumores de presos ainda encarcerados

Famílias continuam com esperança de encontrar desaparecidos na prisão conhecida como “matadouro humano”.

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Sírios procuram familiares na prisão de Sednaya em alegadas celas escondidas Mariana Godet, Agência Reuters
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A prisão de Sednaya, palco de tortura e execuções de milhares de pessoas, continuava nesta segunda-feira no centro das preocupações de muitas pessoas que seguem a queda do regime de Bashar al-Assad – pelos rumores de que ainda haveria celas subterrâneas com detidos encarcerados, e pela busca que ainda continuava por desaparecidos. Imagens mostravam uma concentração de carros junto da prisão, com muitas pessoas a abandonarem os veículos e irem a pé até ao local.

Os Capacetes Brancos, grupo que se destacou pelo socorro após bombardeamentos, destacaram cinco equipas para a grande prisão, dizendo que, até agora, as duas equipas que tinham conseguido chegar ao local não tinham encontrado sinais das alas subterrâneas ainda com detidos.

“Não encontrámos nenhuma das portas secretas de que se está a falar”, disse o grupo na rede social X (antigo Twitter) mas continuam as buscas com a ajuda de pessoas “que conhecem as entradas e passagens secretas” da prisão.

“As equipas”, acrescentaram, “consistem em unidades especialistas em buscas e resgates, especialistas em derrubar paredes, abrir portas de metal, cães, e socorristas médicos”.

Na prisão concentravam-se medos e esperanças. A BBC ouviu Sharvan Ibesh, da organização não-governamental Bahar, que no meio do “caos” de milhares de pessoas a sair tentou encontrar o pai de uma amiga detido há 13 anos.

Não tendo notícias da prisão, os dois foram ainda a uma mesquita onde estão centenas de prisioneiros que saíram de Sednaya a receber cuidados – há preocupação por exemplo com a chamada Síndrome de Realimentação, que pode acontecer quando pessoas que passaram fome e estão subnutridas começam de repente uma alimentação normal.

Ibesh relatou que na mesquita encontrou dois homens ainda tão desorientados que não conseguiram responder a perguntas básicas como “como te chamas?” ou “que idade tens?”

O jornalista do diário britânico The Guardian William Christou visitou a prisão junto com rebeldes e familiares de pessoas desaparecidas.

Conta como as celas eram pequenas e que algumas tinham mais de 20 pessoas juntas, não permitindo espaço para as pessoas se deitarem. As paredes estavam cobertas de mensagens escritas à mão. “Já chega, levem-me”, era uma delas.

Sobreviventes libertados ainda durante os anos de Assad contaram como dentro da prisão (onde não havia janelas para o exterior) era forçado o silêncio. Um detido libertado ouvido em 2018, ano em que o regime terá levado a cabo mais execuções para se livrar dos detidos, numa altura em que consolidou o poder, segundo uma investigação do Washington Post, contou como os guardas obrigavam os presos a estar em silêncio nas celas, onde dormiam em cobertores infestados de carraças, em chão pegajoso de fluidos corporais, como “animais numa jaula”. “Alguns desistiram, outros ficaram malucos. A morte seria uma bênção para eles”, disse então.

A Amnistia Internacional disse que a dada altura chegaram a estar 20 mil pessoas presas no local, a maioria depois de julgamentos que duraram apenas poucos minutos.

Ainda à procura de desaparecidos

Estima-se que tenham sido mortos até 13 mil sírios na prisão entre 2011 e 2016. Muitos foram executados, outros morreram devido às duas condições, doenças ou fome.

O jornalista William Christou descreve uma prisão organizada em torno de uma escada em espiral, com grandes portas idênticas, atrás das quais estão as três alas do edifício. Não há janelas para o exterior.

Bashar Barhoum saiu da sua cela no domingo, achando que ia ser executado, depois de sete meses preso. Mas rapidamente percebeu que não eram guardas da prisão que estavam à porta.

“Não vi o sol até hoje”, disse à Associated Press. “Em vez de estar morto, Deus deu-me um novo sopro de vida.”

Rim Turkmani, directora do Programa de Investigação do Conflito na Síria na London School of Economics (LSE), contou por seu lado à BBC como a sua família está a tentar obter informações do seu primo, que foi preso em Sednaya, em 2016, quando tinha 18 anos.

“Estamos a ver todos os vídeos, todas as fotografias, e há centenas…”, descreveu. “Imaginem quantas feridas abertas há, quantas mães estão à espera.”

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