"Engraçado como a memória converte as coisas do passado", canta Maria Reis na última canção de Suspiro…. O ano foi dela. Na sua voz uma geração desencantada encontra camaradagem, vulnerabilidades partilhadas — num 2024 em que se assinalaram 50 anos da Revolução e tantos exibem saudades de um regresso a 1973.

O ano foi também de Luísa Costa Gomes, com os seus contos cheios de ironia e apuro literário, e de Charli XCX, que fez de brat a palavra do ano do dicionário Collins. Foi de Francisco Tropa, de Patricia Mazuy, de Shōgun, de Matilha. De Fernando Guerreiro, Janaina Leite, Marga Alfeirão, Bruno Vieira Amaral… 2024 passou por eles — e por tantos outros. Sim, é aquela altura do ano. Sim, é a nossa edição dos melhores do ano.

 
           
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          O coração da música electrónica volta a bater na “Nova Lisboa”

O Sónar Lisboa regressa em 2025 ao Parque Eduardo VII com 43 dos maiores nomes da cultura clubbing actual. Do global ao local, o mundo electrónico faz um takeover ao centro de Lisboa.

         
           
 

"A lista é a origem da cultura. (…) O que quer a cultura? Tornar o infinito compreensível", disse o pensador Umberto Eco à revista alemã Der Spiegel em 2009. Nesta edição, em que fazemos o balanço da cultura mais vibrante e fundamental do ano, reafirmamos o acto colectivo, maravilhosamente humano, de fazer listas.

Perguntei a Martin Puchner, professor da Universidade de Harvard, autor de Cultura – Uma Nova História do Mundo (o melhor livro de não-ficção de 2024 para os críticos do Ípsilon) porque é que precisamos de listas.

Disse ele:

As listas, as compilações, as antologias desempenham um papel extremamente importante: seleccionam, mas também preservam, elegem uma coisa em vez de outra. Tudo isso é feito por humanos. E é tudo feito para eles: em qualquer altura da história cultural, os humanos compilam listas para as suas necessidades.

Hoje, fazem mais sentido do que nunca: servem de filtro. Vivemos numa época de abundância: há tantos livros, tantos objectos culturais, fragmentação. Pode ser algo muito desorientador.

Ao longo da história humana, a cultura teve sempre de ser armazenada algures e os sistemas de armazenamento preservados. É preciso transmiti-la à geração seguinte. Há custos enormes associados à cultura, o que leva a que exista uma luta brutal, darwiniana, entre o que sobrevive e o que não sobrevive.

Mas os cálculos mudaram, em certa medida, porque o custo do armazenamento cultural é, pela primeira vez, quase zero. Também por isso há esta abundância. É por isso que precisamos de filtros. É por isso que os algoritmos são tão poderosos e sentimos que talvez dependamos demasiado deles.

A lista talvez seja uma espécie de contra-algoritmo. É uma criação humana, não de nicho, feita para responder ao perfil de cada um, mas um filtro que tem uma lógica diferente: uma lógica humana.

Nesta edição, temos também análises sobre 2024:


Mas nem só de listas e balanços vive este Ípsilon. Ricardo da Rocha entrevistou Gavin Bryars, um dos maiores nomes da música experimental, compositor dos clássicos Jesus’ blood never failed me yet e The sinking of the Titanic. Vai actuar este fim-de-semana em Braga e Espinho.

Mário Lopes, especialista em matéria beatlesca, volta aos Fab Four a propósito do badalado – e produzido por Martin Scorsese – Beatles ’64. "Conta a história da chegada dos Beatles à América. Entre o já conhecido e o aliciante de novas perspectivas, fica a meio caminho."

Também neste Ípsilon:

– Cinema: críticas a O Crepúsculo do Pé Grande, O Meu Bolo Favorito e Eu Não Sou Tudo o Que Quero Ser;

– Música: Vice Versa, dos Ganso, e Spiral in a Straight Line, dos Touché Amoré;

– Livros: a antologia de Zbigniew Herbert Poesia Quase Toda e Sangue na Neve — A Revolução Russa 1914-1924, do historiador Robert Service (ainda só disponível na edição impressa).

E não só. Boas leituras!


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