Operação no Martim Moniz gera críticas. Colectivo Humans Before Borders fala em racismo

Movimento social condenou a operação policial que bloqueou a Rua do Benformoso em Lisboa. Colectivo HuBB acusa Governo de “colar a migração à criminalidade”. PSP reitera legitimidade da operação.

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A operação policial de quinta-feira no Martim Moniz, em Lisboa, resultou na detenção de duas pessoas / LUSA
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O Colectivo HuBB — Humans Before Borders repudiou esta sexta-feira, 20 de Dezembro, a operação policial de quinta-feira no Martim Moniz, em Lisboa, considerando que se tratou de um ataque de cariz racista aos migrantes que frequentam aquela zona da cidade.

Em comunicado, o movimento, que junta voluntários que lutam pelos direitos dos refugiados e migrantes, considera que a operação policial, que bloqueou a Rua do Benformoso e "encostou dezenas de residentes e transeuntes à parede" não é uma situação isolada.

"Esta operação acontece como apenas a última de uma série de agressões por parte das autoridades portuguesas a pessoas migrantes e em situação de sem-abrigo naquela zona da cidade, das quais se destacam a operação de fiscalização da PSP e ASAE com o objectivo alegado de 'combater a percepção de insegurança entre os cidadãos' e as várias remoções de tendas ao longo da Avenida Almirante Reis", escreve o movimento. Considera que se trata de "mais um ataque aos direitos de migrantes em Portugal por parte de um Governo que, desde que tomou posse, insiste em colar a migração à criminalidade".

O activista do Colectivo HuBB Miguel Duarte, citado no comunicado, considera que esta tentativa de relacionar a migração à criminalidade "é uma mentira descarada" e "não é inocente". Estas operações "não passam de performances de crueldade com o objectivo de aliciar o eleitorado da extrema-direita", sublinha.

Marta Bernardo, também activista da HuBB, sublinha na mesma nota que tratar estas pessoas como suspeitas "retira-lhes a dignidade, despe-lhes o rosto e desumaniza-as". "Vem também mostrar, mais uma vez, em plena luz do dia, a crescente violência estrutural levada a cabo pelos serviços de segurança pública, particularmente para com a população migrante", acrescenta.

O colectivo HuBB — Humans Before Borders exige ainda o fim deste tipo de "manobras discriminatórias", considerando que "agravam o estigma contra pessoas migrantes que se faz sentir na sociedade portuguesa".

Operação policial gera críticas

A operação policial de quinta-feira no Martim Moniz, em Lisboa, com meios das Equipas de Intervenção Rápida (EIR) e das Equipas de Prevenção e Reacção Imediata, resultou na detenção de duas pessoas e na apreensão de quase 4000 euros em dinheiro, bastões, documentos, uma arma branca, um telemóvel e uma centena de artigos contrafeitos. Em comunicado, o Comando Metropolitano de Lisboa (COMETLIS) da PSP esclarece que uma das pessoas foi detida por posse de arma proibida e droga, enquanto a outra era suspeita de pelo menos oito crimes de roubo.

A operação foi acompanhada por uma procuradora da República e foram cumpridos seis mandados de busca não domiciliária. O enorme aparato policial na zona levou à circulação de imagens nas redes sociais, nas quais se vislumbram, na Rua do Benformoso, dezenas de pessoas encostadas à parede, de mãos no ar, para serem revistadas pela polícia, e comentários sobre a necessidade daquele procedimento.

Questionada sobre o assunto, a porta-voz do COMETLIS, subcomissária Ana Raquel Ricardo, explicou que uma "operação especial de prevenção criminal dá legitimidade para fazer outro tipo de diligências, nomeadamente a revista de cidadãos que se encontrem no local e revista de viaturas" que por ali circulem. A mesma responsável referiu que o contingente empregue "foi o necessário" para uma operação deste tipo, sem, contudo, revelar o número de profissionais envolvidos.

Mas nem todos concordam com a legitimidade desta operação. Carmo Afonso, advogada e ex-cronista do PÚBLICO, disse que "está tudo profundamente errado" em relação às rusgas no Martim Moniz, lembrando que as pessoas visadas "dividem casa, quarto e às vezes cama com muitas outras e que, por isso, quando não estão a trabalhar costumam estar na rua": "É tudo profundamente injusto e humilhante", classificou. "Mas, hey, é para nos sentirmos melhor e mais seguros. Sim, partem do princípio de que somos todos umas bestas", criticou Carmo Afonso, deixando também um conselho: "Se ver pessoas a serem humilhadas te faz sentir mais seguro, esquece a política, a polícia e procura ajuda para ti."

Miguel Somsen, jornalista e escritor, também reagiu à operação policial nas redes sociais, dizendo que a operação policial foi um caso de "violência, intimidação e vergonha": "Encostaram dezenas de pessoas à parede, fizeram uma detenção, uma. O Governo é PSD mas identifica-se como Chega."

Pedro Marques Lopes, comentador da SIC Notícias, disse sentir-se em relação à operação da PSP no Martim Moniz "revoltado" e "profundamente entristecido". "Revoltado porque vejo um partido e um primeiro-ministro que assume que trata mal inocentes, manda desencadear acções policiais para dissuadir. Ele vai dissuadir gente que vive miseravelmente, que trabalha 12 horas, que na sua maioria trabalha em regime de cama quente, sem qualquer tipo de justificação para haver estas rusgas", defendeu no programa Eixo do Mal.

A Casa do Brasil de Lisboa também manifestou o "maior profundo repúdio" pelas acções da PSP no Martim Moniz, afirmando que se trata de uma "tentativa de criminalização dessa comunidade por meio da acção policial": "Tratou-se de uma operação vexatória, degradante e humilhante, que viola a dignidade das pessoas. Numa democracia, isso é absolutamente inaceitável", escreveu no Instagram.